sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O brincar e o tempo livre(II)

A criança precisa ter tempo livre para descansar e para brincar. O brincar livremente é fundamental até 10, 11 anos, para que a criança se estruture como pessoa, já que ao fazê-lo a criança tenta elaborar as questões em relação ao mundo em que vive. Brincar livremente, ao que quiser, como quiser, facilita a expressão, a projecção das emoções e dos sentimentos ao mesmo tempo que experiência momentos de independência e de autonomia. Precisam, igualmente, de brincadeiras espontâneas, de ter tempo para explorar, de contacto com a natureza e de aventura.
Brincar também tem etapas de desenvolvimento. A criança começa a brincar sozinha, manipulando objectos. Posteriormente procurará companheiros para brincar mas cada um com seu brinquedo. A partir daí irá desenvolver o conceito de grupo e descobrirá os prazeres e as frustrações de brincar com os outros, crescendo, assim, emocionalmente, aprendendo a ganhar e a perder.
Ao brincar a criança fica alegre, vence obstáculos, desafia os seus limites, despende energia, desenvolve a coordenação motora e o raciocínio lógico, adquire mais confiança em si, ao mesmo tempo que vai aprimorando os seus conhecimentos.
Mas… as crianças de hoje têm, claramente, um excesso de actividades que, segundo a psicologia da infância e da adolescência, assim como as ciências da educação e a sociologia têm denunciado, prejudica o seu cabal desenvolvimento.
Em comparação a três ou quatro anos atrás, em média, as crianças passam mais dez horas semanais na escola tendo aí as chamadas AECs - actividades de enriquecimento curricular. Têm 25 horas de aulas por semana, mais dez horas de aulas de enriquecimento curricular e, depois da escola, os trabalhos de casa - tarefas que incluem cópias de textos, repetições de palavras, fichas com contas e problemas diversos que têm que reproduzir. (Para uma criança uma actividade do tipo é uma violência sem nome!) É notório que as nossas crianças se encontram como que “sufocadas”. Há crianças que estão nas escolas desde as oito horas da manhã até depois das dezoito, em actividades que, apesar de mudarem de nome são mais do mesmo: ensinar. Tanto os educadores, como os professores, ou os monitores das AECs têm um projecto em que, de um modo ou de outro, o adulto está sempre presente, orientando, dirigindo, motivando, aconselhando... não sendo esta sobrecarga curricular compatível com as necessidades de desenvolvimento das crianças as quais necessitam de tempo informal para a promoção de um estilo de vida mais activo.
Mas onde podem ficar as crianças quando os pais estão a trabalhar?
Defendemos, há muitos anos, uma pedagogia próxima do brincar, com actividades em que a criança aprende de uma forma lúdica e que tem por base a teoria do lazer: descansar, divertir e desenvolver. A proposta educacional que defendemos encontra-se a funcionar nos espaços de actividades de tempos livres promovidos, ainda que poucos, pelas IPSSs e pauta-se pelo respeito pela criança, sendo esta tratada como um indivíduo livre, pensante, capaz, criativo, crítico, descobridor de seu espaço, ousando sempre novas descobertas, construindo os seus valores, interagindo com o seu meio ambiente, modificando-o e agindo na leveza do ser - do ser-sonho, ser-magia, ser-criação. 
Quer-se que nestes espaços não se sinta a omnipresença da escola e do sistema formal a si associado, mas que exista lugar para a libertação de energias e aproveitamento das capacidades criativas. Igualmente se quer que as vivências diárias tenham a ver com os aprenderes da vida - o eu/tu/nós, a separação/ individualização, a autonomia, a auto-estima e a hetero-estima, facilitando assim os aprenderes da escola.
Pretende-se que, nestes espaços, se possibilite uma intervenção sócio-educativa dinâmica, aberta à comunidade e de relevante interesse pedagógico e cultural, sendo um espaço libertador-criativo e comunicacional, possibilitando minorar a situação de risco social para as crianças, actuando junto das famílias, das escolas e espaços associativos locais, numa envolvência comunitária global e assente numa dimensão relacional promotora de desenvolvimento, possibilitando um acolhimento, um suporte, uma contenção, uma organização e uma estimulação adequados.
Para além destes espaços e destes tempos é de extrema importância que os pais brinquem com os seus filhos. Pelo menos nem que sejam apenas dez minutos por dia! Mas brincar sem qualquer preocupação. Brincar simplesmente: jogar à bola, às escondidas, à apanhada, saltar à corda, brincar com fantoches, com bonecas, ao “macaquinho chinês”...Os pais, muitas vezes, para agradar aos filhos, acreditam que dar-lhes brinquedos em quantidade é a melhor forma de suprir as suas necessidades, mas o brinquedo mais importante, o mais esperado, aquele que ajuda os filhos a ter a certeza de que são amados e desejados, são os “brinquedos pais”.
Se desejam que os vossos filhos cresçam de uma forma harmoniosa e saudável, permitam-lhes que brinquem livremente, que tenham actividades programadas quanto baste e… brinquem MUITO com eles.

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