quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Afeto: o "eterno abandonado!

É com um sentimento de tristeza e ao mesmo tempo de frustração que, mais uma vez, reflito sobre afeto e, neste caso, afeto e educação.

Já lá vão alguns anos que, a quando em aulas de formação para professor, "conheci" Piaget, Wallon, Vygotsky... entre outros dos muitos e bons "professores" que me ensinaram que, através do afeto, a criança adquire todas as condições necessárias para se sentir segura, protegida, e para que adquira um desenvolvimento saudável tanto a um nível escolar, como a um nível social.

A tristeza e a frustração resultam do facto de sentir, hoje, que estas ideias, largamente estudadas, são cada vez menos uma preocupação tanto da escola como da comunidade. Na pressa de se alcançarem, a todo o custo, resultados que mostrem qual é a melhor escola ou a melhor família, os ensinamentos daqueles mestres passaram para um plano secundário ou, até mesmo, deixaram de ser tidos em consideração.


Aprendi que uma educação que tenha como objetivo o ensino e a aprendizagem, também deve trabalhar, na escola, os sentimentos pessoais e interpessoais, não como um simples complemento, mas como uma finalidade de estrutura curricular. Aprendi.Aprendemos. Mas há quem tenha aprendido e esquecido.

Aprendi, aprendemos, que a escola é, por natureza, um espaço rico para o desenvolvimento da inteligência interpessoal, podendo e devendo ser um espaço para que seja estimulada uma reflexão sobre posturas, atitudes e condutas e, ao mesmo tempo, ajudar a identificar valores e crenças indispensáveis ao comportamento ético, responsabilidade e respeito necessários à vida em sociedade.

Aprendi, aprendemos, que o ser humano tem uma base comum: inteligência, emoção e afetividade, os quais são educáveis e construídos. Assim são necessárias estratégias com atividades individuais, em grupo, com e sem adultos; atividades de concentração, e atividades que também permitam o brincar e deem espaço para a fantasia; atividades que propiciem o surgimento das dimensões humanas, de acesso a situações e informações diferentes daquelas que as crianças têm em casa e/ou terão na escola, destacando, principalmente, o direito à vida, à educação, à saúde, à brincadeira, enfim, o direito à infância.

Aprendi, aprendemos, que as crianças devem aprender a questionar, criticar, participar e criar.

Aprendi, aprendemos, com Piaget, que “a afetividade é indissociável da inteligência, pois impulsiona o sujeito a realizar as atividades propostas”; que “os educandos alcançam um rendimento infinitamente melhor quando se apela para os seus interesses e quando os conhecimentos propostos correspondem às suas necessidades”.

Aprendi, aprendemos, com Vygotsky, que inteligência, afeto e emoção são inseparáveis, pois, segundo ele, "as emoções integram-se no funcionamento mental geral, tendo uma participação ativa na sua configuração".

Aprendi, aprendemos, com Wallon, que a emoção tem um papel fundamental no processo do desenvolvimento humano e que, “quando uma criança nasce todos os contatos estabelecidos com as pessoas que cuidam dela, são feitos via emoção”; considera afetividade e inteligência como fatores interligados, e defende que a educação da emoção deve ser incluída entre os propósitos da ação pedagógica; "a emoção e a inteligência são importantes no processo de desenvolvimento da criança, de forma que o professor deve aprender a lidar com o estado emotivo da criança para melhor poder estimular seu crescimento individual".

Sei, sabemos, que as crianças que possuem uma boa relação afetiva são seguras, têm interesse pelo mundo que as cerca, compreendem melhor a realidade e apresentam melhor desenvolvimento intelectual.

Sei, sabemos, que em todas as escolas existem crianças com problemas de auto-estima, crianças tristes, com dificuldades de aprendizagem, que não interagem com as outras, agressivas, rotuladas de complicadas, sem limites, sem educação. Essas crianças,de uma maneira geral, têm problemas de afeto, mas esses problemas podem (e devem) ser trabalhado pela escola, proporcionando-lhes desde logo, um ambiente tranquilo e acolhedor, no sentido de amenizar as suas angústias, deixando-as mais à vontade, mais seguras, mais livres, e onde a autoridade, a firmeza e a tolerância, sejam exercidas tendo por base a cordialidade e a confiança.

O crescimento pressupõe o desenvolvimento das diversas facetas do ser humano: a cognição, a afetividade, a psicomotricidade e o modo de viver. Assim sendo, educar tem que ter por base não só "o que pensar", mas também "como pensar". Para que isso aconteça devemos propiciar às nossas crianças, ambientes alegres, felizes o que significa espaço para dialogar, discutir, questionar e compartilhar saberes ou seja, espaço para a construção de um conhecimento significativo.

A minha tristeza e frustração levam-me a concluir que estamos longe de considerar o fator afetivo na relação professor-aluno, o que quer dizer que corremos, o sério risco, de educarmos na construção do real e do conhecimento, deixando de fora o lado humano que constitui o sujeito nos seus valores e caráter; de educarmos sem o que, ontem e hoje, foi e é considerado a "chave" da educação: o amor, o afeto, o carinho que, por sua vez, levam a uma autoestima positiva e à resolução dos problemas internos.

Mas...quero acreditar que estamos numa "fase" passageira e que, mais cedo ou mais tarde, chegaremos a "bom porto".

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

As crianças aprendem o que vivem

"Se a criança vive  com críticas,
    Ela aprende a condenar
Se a criança vive com hostilidade,
    Ela aprende a agredir.
Se a criança vive com zombarias,
    Ela aprende a ser tímida.
Se a criança vive com humilhação,
    Ela aprende a se sentir culpada.
Se a criança vive com tolerância,
    Ela aprende a ser paciente.
Se a criança vive com incentivo,
    Ela aprende a ser confiante.
Se a criança vive com elogios,
    Ela aprende a apreciar.
Se a criança vive com retidão,
    Ela aprende a ser justa.
Se a criança vive com segurança,
    Ela aprende a ter fé.
Se a criança vive com aprovação,
    Ela aprende a gostar de si mesma.
Se a criança vive com aceitação e amizade.
    Ela aprende a encontrar amor no mundo."

             (Dorothy Low Nolte)

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Sem Infância não há Humanidade

Sem infância não há humanidade. Quer isto dizer que o futuro depende do hoje. Se as crianças, grupo social com permanência na sociedade, com um espaço e um tempo próprios, com especificidades culturais, sociais, económicas as quais configuram dissemelhanças significativas entre elas, não tiverem uma infância com vivências repletas de oportunidades, de afectos, de condições que lhes proporcionem um desenvolvimento harmonioso, a humanidade viverá em insuficiência e a caminho do precipício, já que a infância marca a etapa da vida de qualquer indivíduo e determina a organização de qualquer sociedade.

Não obstante esta realidade a sociedade tem, ao longo dos séculos, e no início do século XXI não se notam alterações significativas, persistentemente, inviabilizado a infância, comprometendo o seu reconhecimento como grupo social com direitos.

Para que a criança se desenvolva bem, precisa de um ambiente afectivamente equilibrado, onde receba amor autêntico e onde lhe permita satisfazer as necessidades próprias da infância, como por exemplo: um ambiente familiar saudável, bons vínculos parentais, condições básicas em termos de habitação, saúde, alimentação, educação e lazer, estímulo constante da auto-estima e em que seja aceite como pessoa importante, com demonstrações de afecto, com respeito e amor, em que a educação transmita os valores e os princípios sociais de uma dada cultura. É na construção de um ambiente que satisfaça aquelas necessidades, que teremos que trabalhar ao nível da intervenção primária, secundária e terciária, com as famílias, com as entidades com competência em matéria de infância e juventude e com a comunidade em geral.

Importa trabalharmos no sentido de consciencializarmos os pais, por exemplo, de que responsabilidade educativa não pertence em primeiro lugar ao Estado e à Escola, mas a eles próprios pois, com tão bem nos disse João dos Santos, "ninguém recebe, de facto, educação fora da família que interiormente prossiga a formação de uma personalidade autêntica, equilibrada e valiosa, se, antes, não tiver recebido os alicerces através de uma experiência relacional de um amor instintivo, espontâneo e autêntico que só os pais são capazes de proporcionar".

Citando mais uma vez João dos Santos, diremos que importa garantir condições que permitam à criança nascer e crescer num ambiente familiar saudável que contribua para prevenir a tempo as perturbações psíquicas, as dificuldades de aprendizagem, a rejeição escolar e a violência infantil e juvenil, a violência em todas as idades, já que " todo o evoluir da criança, com todas as suas perturbações psíquicas ou emocionais têm origem na relação pais/criança".

Mais uma vez diremos: sem relação afectiva não há vida.

É que, como nos disse João dos Santos, “não deve ser esquecido que a função racional e emotiva do ser humano assenta no que lhe deu origem e lhe confere progressivo aperfeiçoamento e sentido: a relação, o afecto e o sonho”.(In-Relatório 1ºSemetre CPCJ Santarém)



quinta-feira, 26 de maio de 2011

Exemplo e Valores

Nos dias de hoje, em que a discussão e o debate está centrado em torno de ideias e fundamentos de ordem política, importa reflectimos acerca de se saber se a sociedade em que vivemos quer, efectivamente, envolver-se na enorme tarefa de auxiliarmos as nossas crianças a adquirirem os valores inerentes a uma vida cidadã, activa, responsável e tolerante...
Antes de mais importa que cada um clarifique, para si e em si, os seus próprios valores, pois só assim os poderá transmitir. É importante percebermos que valores humanos universais são necessários ser sentidos para poderem ser transmitidos de forma a formar cidadãos éticos e preparados para viver em sociedade.
Na família, na escola, na sociedade é cada vez mais frequente a indisciplina, a rebeldia, o envolvimento com o álcool  e drogas, a violência entre iguais...
É importante que nos interroguemos sobre que valores estamos a transmitir às nossas crianças.
Jean Piaget, biólogo suíço, afirmou que valores são "investimentos afectivos, ligados às emoções. Por outro lado, sabe-se hoje que o ambiente moral em casa e na família, tem uma enorme importância na formação e educação da criança; infelizmente muitas famílias hesitam (ou desistem mesmo) em transmitir valores pensando que estão a ser moralistas ou autoritárias.
É evidente que os valores não necessitam de ser os mesmos em todas as famílias. O importante é a sua clareza; o importante é que as crianças sintam e respeitem os outros, tal qual são e para com eles aprendam a ser solidários.
Nos tempos que correm as pessoas estão alarmadas com o que se estará a passar com os nossos adolescentes.
         Importa, antes de mais, entender que na adolescência a palavra principal não é "formação", mas sim "transformação". É preciso perceber-se que  os adolescentes colocam os seus valores em dúvida, testando-os, o que é extremamente importante para o seu amadurecimento (se os valores transmitidos e interiorizados na infância não tenham sido os mais adequados, os mesmos virão a reflectir-se na forma como a adolescência virá a ser vivenciada).
          Deixo aqui algo que tento (tento digo bem) todos os dias fazer: dar o exemplo. Para além de termos que conhecer os nossos valores, precisamos de praticá-los no nosso dia a dia, tanto nas pequenas como nas grandes atitudes.
          Educar para os valores não é mais nem menos, que convidar alguém a acreditar naquilo que acreditamos.
          
     

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Vida e Educação

Uma das questões fundamentais do sistema democrático é sabermos se queremos  e podemos participar na vida em comunidade; se queremos e somos capazes de viver no seio das nossas comunidades naturais de pertença, pensando e construindo um destino comunitário comum, onde a educação tem como objectivo “...fazer com que todos, sem excepção, façam frutificar os seus talentos e potencialidades criativas, o que implica, por parte de cada um, a capacidade de se responsabilizar pela realização do seu projecto pessoal”.(Delors, 1997)
A educação constitui o principal meio de transmissão de culturas e de valores, contribuindo para um espaço de socialização e construção de projectos comuns, respeitando a diversidade dos indivíduos e dos diversos grupos, dotando-os de capacidades para construir o seu próprio desenvolvimento e capazes de erguer o progresso social, assente numa participação responsável e coesa, garantindo os instrumentos para uma inserção participativa e transformadora na sociedade, o que significa o domínio da leitura, da escrita mas também das artes, o acesso de forma crítica ao conhecimento elaborado, a vivência de formas de participação e a construção de valores.
Educar é trazer para a vida da criança o jogo existencial pelo qual a humanidade se faz humanidade, é possibilitar o aparecimento e a incorporação de símbolos humanos, sendo o objectivo fundamental da Escola a humanização e o seu objecto a cultura — compreendida enquanto a procura de um modo de existir.
 A Escola deve formar os indivíduos para que apreendam o movimento criador da cultura, para que sejam os criadores do novo e os heróis da transformação, mas tendo em atenção que um dos aspectos fundamentais da vida é o seu carácter lúdico, que se expressa pela espontaneidade: por mais que tentemos forçar a vida para um rumo “certo”, por mais que tentemos direccioná-la para um futuro pré-estabelecido, ela cria sempre os seus próprios caminhos, constrói os seus próprios atalhos e subverte os projectos programados. E é o lúdico que fornece à vida essa capacidade criadora. É o lúdico que abre as portas para o sonho, para a magia e para a utopia. A criatividade deve entrar na Escola através da brincadeira, do brinquedo e do jogo, onde imperam a imaginação e a magia.
A utopia está não só na Escola, mas onde quer que exista um ser humano. Afinal, vivemos não pela certeza de que vamos morrer mas sim pela certeza de que estamos vivos e de que, vivos podemos criar, transformar, plantar árvores, soprar bolhas de sabão pelo céu.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Ética e Cidadania


Tendo por base que o conceito de ética se traduz num conjunto de valores morais e de princípios que norteiam a conduta humana na sociedade, os quais contribuem para que haja um equilíbrio e bom funcionamento social; que cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar activamente na vida em comunidade, e; que quem não tem cidadania se encontra marginalizado ou excluído da vida social, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social, importa promover uma educação para a ética e cidadania.
A escola é um espaço de vivência no qual as crianças e jovens podem discutir, trabalhar e entender os valores éticos e morais que fazem parte de toda e qualquer acção de cidadania. Na escola a criança e o jovem deverão entender o sentido do que é conviver com democracia e ética, sendo os seus educadores e professores as figuras modelo a serem seguidos.
Tendo em consideração as afirmações anteriores, importa desenvolver nas escolas projectos capazes de fortalecer o protagonismo das crianças e jovens na construção de valores, de conhecimentos pessoais, sociais e políticos, tendo em vista a cidadania e; contribuir para a formação dos profissionais de educação, a fim de que possam actuar com a intencionalidade necessária à construção de uma sociedade mais justa, solidária e feliz.
Para tal pensamos que esses projectos deverão ter como objectivos gerais os seguintes:
·         Motivar a comunidade escolar a actuar tendo por base os princípios do respeito, da solidariedade, da responsabilidade, da justiça e do diálogo nas diversas situações da sua acção;
·         Construir um Fórum Escolar sobre Ética e Cidadania em Agrupamentos de Escolas;
·         Promover o intercâmbio de experiências entre escolas;
·         Elaborar e disseminar recursos didácticos e materiais pedagógicos conducentes à promoção de valores na escola e na comunidade;
Mais especificamente pensamos que tais projectos deverão:
·         Levar ao quotidiano das escolas a reflexão sobre os valores éticos e sobre os seus fundamentos;
  • Motivar para a reflexão e realização de acções sobre o significado e importância da ética no desenvolvimento humano e nas suas relações com a comunidade em que vivem;
  • Fomentar a construção de relações interpessoais com sentido democrático tanto na escola como na comunidade;
  • Desenvolver o tema dos direitos humanos visando a construção de valores socialmente desejáveis;
  • Promover e desenvolver experiências educativas tendo por base na Declaração Universal dos Direitos do Homem, bem como a Convenção dos Direitos da Criança;
·         Entender a escola e a comunidade como espaços inclusivos, abertos às diferenças e à igualdade de oportunidades;

“Assim como o médico existe para prevenir e curar doenças e a sua felicidade é a recuperação do seu paciente, o professor deveria pensar que a sua missão é a de ensinar a quem não sabe, ajudar a amadurecer os imaturos e que sua felicidade está em ver o progresso gradual de todos eles, caso contrário, não haveria necessidade de escola, professores e sistema educativo." (Hamilton Werneck)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Chega de violência doméstica

Confesso, aqui neste blogue, que me encontro extremamente preocupado com a situação vivenciada por, direi, milhares e milhares de criança que, neste meu país à “beira mar plantado” são vítimas de violência doméstica.
Venho assistindo, diariamente, a um crescendo sem fim, de crianças vitimizadas nas lutas e nas guerras, nas discórdias entre os seus pais. Mães batidas, violentadas, traumatizadas; pais a quem foi retirada a possibilidade de o serem; crianças a sofrer, a chorar por fora e por dentro, agredindo, fugindo…
Dir-se-á, em jeito de compensação, que a violência doméstica é um fenómeno cada vez mais comum nas nossas sociedades. Seja. Mas há “fenómenos” que têm que ser banidos, expulsos dessas mesmas sociedades, sob pena destas se transformarem em sociedades sem valores, sem princípios e sem espaço para se viver feliz.
Existe, na violência doméstica, outras vítimas, tão mal tratadas quanto as agredidas, que muitas vezes são esquecidas no drama da violência doméstica: as crianças. É impressionante o facto de os pais não perceberem isto. Muitas vezes, “juram a pés juntos”, que fazem tudo pelos seus filhos; juram que os amam; juram que não lhes querem causar nenhum dano, chegam a verter lágrimas (de crocodilo com certeza) … mas causam.
Causam e muito. Ao testemunharem a violência entre os seus pais as crianças são agredidas sob o ponto de vista de abuso psicológico, uma vez que a criança vai viver num clima de medo constante, sendo o seu mundo marcadamente confuso, assustador e inseguro. Há quem diga, em jeito de desculpa, que são muito “pequeninas” e não entendem, ou que são já “grandes” e compreendem. (Estes são os mesmos das “lágrimas de crocodilo”).
Todos os estudos realizados, por especialistas no desenvolvimento da criança, são unânimes em reconhecer de que, testemunhar a violência de um pai sobre o outro, mesmo que violência psicológica, produz efeitos tão negativos à criança como se fosse ela o alvo directo dessa violência.
Esta “guerra” (com aspas? vou tirar as aspas), esta guerra, porque para a criança trata-se de uma guerra, causa-lhe sérios problemas em termos emocionais, cognitivos e comportamentais.
Vejamos: em termos emocionais estas crianças manifestam reacções de medo, agressividade, culpa, ansiedade, insegurança e confusão. Por outro lado existe uma ambivalência de sentimentos em relação ao agressor e à vítima.
Quanto ao desenvolvimento cognitivo, estas crianças apresentam uma menor capacidade de resolução de problemas, baixos níveis de realização escolar e a interiorização da violência como forma legítima de obter poder e controlo sobre os outros.
No que diz respeito ao comportamento, apresentam mais problemas no cumprimento das regras, dificuldades de relacionamento interpessoal e podem manifestar comportamentos mais agressivos perante os pares ou adultos.
Infelizmente ainda há quem pense e acredite (erradamente é claro), que as crianças apagarão da memória a violência se se não falar muito sobre ela e menosprezam este tipo de violência face às crianças.
A violência doméstica é um fenómeno complexo e as suas causas são múltiplas e de difícil definição. No entanto as suas consequências são devastadoras para as crianças e jovens. Ao contrário do que se possa pensar, as desigualdades sociais não são factores determinantes da violência doméstica, pois esta encontra-se, democraticamente, dividida em todas as classes sociais.
Pais: as situações de violência doméstica e do não entendimentos, a quando da separação e do divórcio quanto às relações parentais, causam graves problemas na vida dos filhos. Em nome dos vossos filhos vos peço: parem de com este mau trato perante aqueles que dizem amar!

quinta-feira, 24 de março de 2011

Projectos educativos de escola – perspectivas (II)

Parece hoje comum afirmar-se que a relação escola/família é uma dimensão importante do trabalho educativo, sem o qual a escola tende a construir respostas restritas e inadequadas face às características dos alunos e à sua experiência sócio familiar. É reconhecida a importância da família como primeiro espaço socializador, com o qual a escola deve estabelecer relações de proximidade, com vista a um melhor conhecimento da criança. São no entanto sobejamente conhecidas as dificuldades experimentadas quando se trata de partilhar espaços e poderes, - sendo recíprocas as acusações e as defesas - e a ausência de um trabalho, de troca de saberes e perspectivas.
          O trabalho com as famílias e com a comunidade funciona mais como um adorno pedagógico do que como mudança efectiva. Ora o trabalho de projecto centrado numa perspectiva de desenvolvimento local deve assentar na valorização da escola e da família num paralelo com toda a comunidade de pertença, criando uma mudança instituinte de uma globalização da acção educativa, no quadro de um território educativo onde a escola se assuma como entidade capaz de operar mudanças, gerindo os recursos locais e a sua relação com os projectos e programas de intervenção, de forma a permitir o enraizamento social e o sucesso educativo e não só reproduzir desigualdades.
          A escola como espaço local de educação, pode então ser considerada como factor de extrema importância no processo de desenvolvimento, desde que esteja organizada de uma forma aberta à comunidade e à sua cultura, - escola charneira - valorizando os seus saberes, ajudando a superar certos constrangimentos, respondendo, entendendo e acolhendo os interlocutores locais, mobilizando recursos existentes no território local, satisfazendo assim as necessidades educativas e formativas das populações e ao mesmo tempo inovando partindo desses mesmos recursos e dessas necessidades.
          "A passagem de um modelo de escola "serviço local do Estado" para uma organização escolar entendida como "centro local de educação" é um processo social complexo, conflituoso, que obrigará à clarificação de muitos conceitos, papéis e funções" (Azevedo, 1994), mas será o modelo que construirá uma escola orientada pela, e para a preocupação, de um processo local e global de desenvolvimento integrado, pressupondo a capacidade de uma articulação, em rede, - sistema ecológico - numa perspectiva de constituição de territórios educativos, [(...) espaço de relações e trocas baseado num projecto idealizado e executado por todos os intervenientes (Pinhal, 1995)],  diferentes escolas de diferentes comunidades em torno de projectos integrados e integradores.
          Uma escola, verdadeiramente comprometida num processo de organização escolar com dinâmica social de parceria com outras instituições e agentes locais, deverá utilizar métodos de envolvimento, os quais, estão estreitamente ligados às diferentes etapas de cada projecto, utilizando uma pedagogia que deve ser um meio de formação através de condutas de participação, de negociação e de compromisso o que tem subjacente um modelo organizacional de parceria.
          Esta metodologia passará por uma fase inicial de sensibilização, informação, motivação, envolvendo a comunidade; prosseguirá numa fase de diagnóstico e de elaboração do projecto o que permite identificar problemáticas e decidir as acções a conduzir e; concluirá numa fase de concretização,  de acompanhamento e de avaliação.
          No entanto e porque "as realidades são constantemente criadas e recriadas pelos actores, através da forma pela quais percebem e interpretam as características do meio em que agem" (Pinhal, 1995), essa avaliação conduzirá a novos projectos prosseguindo assim o desenvolvimento comunitário, "no sentido de contribuir para a globalização da acção educativa, no quadro de um território comunitário, estabelecendo sinergias entre educação formal e não formal, articulando educação escolar e extra-escolar, educação de adultos e de crianças" (Canário, 1983 citado por Matos, 1997).

segunda-feira, 21 de março de 2011

Projectos educativos de escola – perspectivas (1)

Uma maior abertura da escola à comunidade deve assentar, principalmente, no reconhecimento de que a educação é uma das dimensões importantes das políticas de desenvolvimento, radicando esta importância no factor de que esse processo permite a adequação dos projectos de escola às necessidades das comunidades permitindo um planeamento global de natureza estratégica e uma gestão mais racional dos recursos a nível local respondendo, simultaneamente à autonomia e identidade da escola, devendo esta estar plenamente ao serviço da mudança e da consciencialização comunitária, valorizando-se assim a criação de redes e canais de comunicação, articulando os espaços formais e não formais da educação contribuindo efectivamente para a redução das desigualdades sociais, encontrando mecanismos que promovam o sucesso escolar, pessoal e profissional.
          Partindo destas premissas, o papel da escola passa por etapas "interiores" mobilizadoras e motivadoras para a mudança de atitudes, pela aquisição de novos conhecimentos no sentido de intervir no meio, o que deverá acontecer pela introdução de metodologias de intervenção - acção, as chamadas metodologias de projecto, centradas numa pedagogia que atribui ao indivíduo o papel de actor e sujeito da sua própria formação. Assim, os vários intervenientes: professores, técnicos, animadores, leaders das instituições públicas e privadas e população local, podem interagir, criando e recriando as condições indispensáveis à alteração da situação das populações e do meio, o que implica que a educação deve ser "dirigida para a co-responsabilização sobre o mundo em que vivemos, o que só é viável com o seu conhecimento e com o sentido do dever e liberdade/autonomia para nele actuar conscientemente" (Moreno, 1996).
          Assim sendo há que, forçosamente, conceber uma escola que responda a um modelo de desenvolvimento endógeno valorizando os recursos locais - humanos e naturais. Educação e desenvolvimento deverão caminhar a par, sem ambiguidades, sem que a primeira surja encrostada a interesses específicos de determinados segmentos da sociedade civil, " visando a dupla promoção do sucesso escolar e a apropriação territorial", apoiada" numa perspectiva construtivista, em que boa parte do ensino tomará a forma de orientação personalizada dos alunos" (Moreno, 1996). Então o professor sendo um agente local, para além da transmissão de um saber global comum, serviria de mediador/negociador num processo educativo com impacto real junto das populações, em que os destinatários se transformariam em parceiros, transformando os projectos de escola de meros processos de "interligação com a comunidade" com intervenção socioeducativa, em projectos com uma forte componente de interacção socioeducativa, permitindo a médio prazo um percurso de desenvolvimento local intra-integrado.
          Conceber e executar um projecto de educação centrado nestas premissas, exige uma transformação dos sistemas convencionais de ensino baseados em espaços especializados, numa relação unidireccional professor/aluno, em programas de estudo totalmente pré-definidos e em que a acção educativa é uma mera extensão institucional.
          Esta transformação passa por uma intervenção política concertada, que enquadre regionalmente objectivos nacionais em projectos educativos locais, em que a escola, permanecendo autónoma, conte com o apoio da comunidade que serve, mas sobretudo, troque com ela ideias, experiências, reflexões e projectos, dando sentido concreto aos princípios da participação. Os projectos educativos de escola assim concebidos, tendo por base projectos próprios, que integrarão aquela participação como "elemento chave de uma política de desenvolvimento que permite adequação dos projectos a necessidades reais da população, que possibilita a optimização dos recursos locais, que reforça a identidade colectiva e que contraria os efeitos perversos de políticas centralizadas, traduzidas no acentuar de assimetrias" (White, 1982, citado por Matos, 1997), que invalidam o processo de envolvimento passo essencial do processo de desenvolvimento.
           Na linha do conceito de desenvolvimento local, o projecto educativo pode efectivamente ser uma instância de intervenção importante, que mobiliza estratégias, parceiros e recursos em referência a uma comunidade específica (como território, mas também como espaço de sociabilidades e representações), e permite "a concertação de objectivos e a coordenação de recursos entre o poder autárquico, os agentes económicos, e culturais e as próprias escolas" (Barroso, 1992 citado por Matos, 1997).
          Neste sentido, um outro aspecto a ter em conta, necessariamente ligado ao anterior, é de que o projecto educativo venha alterar uma perspectiva redutora da educação, redimensionando-a a "um alargamento do âmbito da intervenção educativa, em termos de espaços, tempos e de factores sociais envolvidos, percussões nas relações de poder e de saber no interior da escola" (Canário, 1992). Com esse fim estes projectos terão que ir mais além do que, o dinamizar uma abertura da escola, com "a criação de espaços curriculares, centrados no estudo do meio, na multiplicação de saídas, na realização de reuniões de pais", investindo fundamentalmente na "alteração das modalidades de trabalho pedagógico", ou seja, "a passagem de uma lógica de consumo para uma lógica de produção que dá a medida da adequação do contexto escolar ao contexto social e cultural, à diversidade dos alunos, às suas experiências, saberes e interesses" (Canário, 1992).

sexta-feira, 18 de março de 2011

O álcool – “lobo com pele de carneiro”

Zago(1996) disse-nos que o álcool é uma droga psicoactiva chamando-lhe “lobo com pele de carneiro”.
As bebidas alcoólicas prejudicam, gravemente, a vida das pessoas e, principalmente, dos nossos jovens. Sabendo isso, a Organização Mundial da Saúde considera o alcoolismo uma doença de carácter triplo, pois afecta a mente, o físico e o social. Esta mesma Organização definiu, como meta até ao ano de 2015, diminuir o consumo de álcool a 6 litros perca pita por ano para a população de 15 ou mais anos, e reduzir o consumo de álcool na população de 15 ou menos anos até ao limiar de 0%. Portugal, consciente desta realidade, publicou a Resolução de Conselho de Ministro nº 116/2000 de 29 de Novembro e aprovou o Plano de Acção contra o Alcoolismo em 24 Janeiro de 2002 com a publicação do D.Lei nº 9/2002, sendo proibida a venda de bebidas alcoólicas a crianças com menos de 16 anos.
 Não obstante continua-se a subestimar o seu consumo, e até se considera, por vezes, que é uma fonte integrante de uma vida “normal”, estando presente, praticamente em todos os ambientes e situações: aparece nos finais de semana, como momento de lazer, associa-se a desportos, viagens, trabalho (almoços de “negócios”, regados com doses de whisky, cerveja e outros).
Desde muito cedo os jovens aprendem que beber uma cerveja com os amigos é um acto social válido. Hoje em dia o álcool é sinónimo de noite, emancipação, diversão…Segundo um estudo da DECO mais de metade dos jovens, entre os 12 e 15 anos, conseguiu comprar bebidas alcoólicas e, portanto, ingeriu este tipo de bebidas.
Estando os jovens num processo de desenvolvimento biopsicossocial o consumo de álcool afecta-os, profundamente, havendo repercussões para toda a vida.
É sabido que a o álcool diminui a actividade cerebral afectando a capacidade de coordenação dos movimentos corporais, prejudica os reflexos e o sono, a noção de certo ou errado, a memória, a aprendizagem e o rendimento escolar, a motivação, o autocontrole, provoca efeitos similares aos da depressão como torpor, tonturas, distúrbios, enjoo, vómitos, fala incompreensível, reflexos comprometidos e ressaca. Atinge, além disso, outros órgãos do corpo, como o coração, a corrente sanguínea, o fígado, em suma, afecta e altera as capacidades psíquicas, e, quanto mais precoce é o consumo, maior é o número de problemas. Isso é grave, pois sabemos que quanto mais cedo o jovem começa a beber, mais vulnerável ele fica, também, ao consumo de outros tipos de drogas.
Mas há mais: a ingestão de bebidas alcoólicas é o factor que mais coopera para a sucessão de acidentes, violência doméstica, abusos e negligência infantil, “brigas” entre familiares e até mortes. Tem relação com vários problemas e patologias agudas e crónicas de aspecto físico, psicológico e social, sendo considerado um importante problema de saúde pública. O número de indivíduos que adquire cancro entre os que ingerem bebidas alcoólicas é assustador, pelo facto da acção tópica do álcool em conjunto com os aditivos usados nos processos de fabricação das bebidas serem altamente cancerígenos. Além do mais, no que diz respeito mais uma vez aos jovens, a ingestão de álcool está directamente relacionado com doenças sexualmente transmissíveis, consumo de outras drogas, abuso sexual e conduta violenta entre iguais.
Parece que as acções preventivas, não têm sortido efeito ou, então, não têm sido suficientes para diminuir os factores de risco. É necessário promover os factores protectores, com acções positivas, tais como: oferecer oportunidades de auto-realização para os jovens; incentivar os desafios e conquistas (auto-estima); auxiliá-los a lidar com frustrações, raiva, ou seja, com as emoções; incentivar e promover vínculos com pessoas que não usam drogas; criar ambientes com regras claras e não tolerantes ao uso de drogas; estimular programas de prevenção nas escolas, tendo por base a prevenção em conjunto com um trabalho e orientação junto dos pais; auxiliar no desenvolvimento de habilidades sociais e na relação com o sexo oposto; incentivar a consciência de cidadania e responsabilidade na comunidade.
Há que promover oportunidades para auto-realização do jovem e de seu pleno desenvolvimento, procurando-se a promoção de uma saúde global. Em Santarém, estes são alguns dos objectivos do projecto “Sorrir à Vida” no âmbito do Programa “PORI” desenvolvido por uma vasta parceria e com o apoio do IDT.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Educar para a cidadania e coesão

A questão fundamental do sistema democrático é de sabermos se queremos e podemos participar na vida em comunidade, se queremos e somos capazes de viver no seio das nossas comunidades naturais de pertença, pensando e construindo um destino comunitário comum onde a educação tem como obrigação, "fazer com que todos, sem excepção, façam frutificar os seus talentos e potencialidades criativas, o que implica, por parte de cada um, a capacidade de se responsabilizar pela realização do seu projecto pessoal".(Delors, 1997). Isto quer, claramente, dizer que a escola deve possibilitar que entre os membros de uma determinada comunidade, se criem vínculos sociais, os quais devem ter por base valores comuns, conducentes ao desenvolvimento do Homem na sua dimensão social, sendo a educação o principal meio de transmissão de culturas e de valores, contribuindo para um espaço de socialização e construção de projectos comuns, respeitando a diversidade dos indivíduos e dos diversos grupos, dotando-os de capacidades para construir o seu próprio desenvolvimento e ao mesmo tempo capazes de construir o progresso social, assente numa participação responsável e coesa.
A participação dos cidadãos na resolução dos problemas comuns, insere-se num dos aspectos fundamentais da educação ao longo da vida, já que se aprende a entender os vários aspectos comunitários, nomeadamente económicos, sociais e culturais, bem como a conceber estratégias de organização, vivenciando aspectos institucionais e interculturais, ao mesmo tempo que se caminha, para um melhor entendimento das intervenções políticas aos diversos níveis, que se traduzem na autonomia e na descentralização dos poderes centrais.
          O processo de conquista de autonomia por parte das populações, passa pela tomada de consciência das relações com o meio e da complexidade dos problemas tanto a nível local, com ao nível regional e nacional. Esta conquista de autonomia, como processo interactivo que é, necessita de ser, apoiado, incentivado e acompanhado, partindo dos recursos e das capacidades locais, os quais terão que ser, forçosamente, dinamizados por uma acção descentralizada, assente nas dinâmicas socioculturais e económicas, na noção da auto-organização, que pressupõe que as colectividades locais tomem consciência de si próprias, (das suas potencialidades e dos seus limites) e das relações com o meio em que se inserem, exercendo uma acção de transformação no espaço local.
          O desenvolvimento, para que possa existir, necessita de possuir um sentido centrado num “sentir” colectivo e nos “alentos” de uma região, os quais deverão ser utilizados de uma maneira adequada, de forma a permitir a sua plena participação no processo de desenvolvimento local. Isto só se torna possível pela intensificação de acções a favor da educação, da formação profissional, da melhoria da gestão dos recursos humanos, pela facilitação da consciencialização entre as responsabilidades familiares e profissionais, pelo desenvolvimento de acções de sensibilização e de informação, pela realização de medidas destinadas a promover a participação das comunidades locais, no processo de decisão, na vida económica, cultural e social.
          Tendo por base o que entendemos por desenvolvimento local, diremos que ele possui certas dinâmicas que se projectam, actores sociais que as promovem sob lideranças que os incentivam, mobilizando as populações para sentimentos de pertença que, na perspectiva de Hirshman  (1958),  citado por Azevedo (1994), leva a que  "o desenvolvimento dependa não tanto da combinação óptima de certos recursos e factores de produção como de fazer aflorar e mobilizar recursos e capacidades escondidos, dispersos ou mal utilizados".
          A acção da escola no processo de desenvolvimento local pode contribuir decididamente para a coesão social e cultural, tanto a nível local, como entre regiões e garantir o equilíbrio entre elas, pelo surgimento das chamadas economia plural e sociedade activa, onde o desenvolvimento económico não seja exclusivamente mercantilista e produtivista.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Mais… brincar!

É sabido que aprendemos algumas acções, medos ou sentimentos por associação, isto é, pela coincidência de vários estímulos que nos levam a estabelecer nexos entre eles. Ou ainda, por meio das consequências da nossa conduta, sejam efeitos negativos ou positivos. Foi Thorndike, em 1911, quem formulou a Lei do Efeito, referente à afirmação anterior e foi Skimner, em 1953, quem contribuiu para o desenvolvimento desta ideia: um comportamento tende a repetir-se quando provoca a aparição de algo agradável para a pessoa, reforço positivo, ou a eliminação de algo desagradável, reforço negativo.
É por meio da experiência, da observação e da exploração do seu ambiente, que a criança constrói o conhecimento, modifica situações, reestrutura os seus esquemas de pensamento, interpreta e busca soluções para factos novos.
A relação entre a vida escolar e o quotidiano constitui a vida da criança, relação que, no mundo actual, necessita de humanização. Torna-se necessário incutir na criança de hoje, os sentimentos da solidariedade, da cooperação, do compartilhar, do prazer de dividir e de dar. É na interacção com seu dia-a-dia que a criança desenvolverá os seus valores, a sua crítica, a sua postura de vida, além da aquisição do conhecimento.
Jogar, brincar, utilizar o brinquedo são oportunidades de desenvolvimento fundamentais e necessárias. Brincando, a criança experimenta, descobre, inventa, aprende e confere habilidades. Além de estimular a curiosidade, a autoconfiança e a autonomia, proporciona o desenvolvimento da linguagem, do pensamento, da concentração e atenção. Brincar é indispensável à saúde física, emocional e intelectual da criança. Brincando, a sua inteligência e a sua sensibilidade desenvolvem-se. A qualidade de oportunidades oferecidas à criança através das brincadeiras e dos brinquedos, garantem que as suas potencialidades e a sua afectividade se harmonizam. A ludicidade, tão importante para a saúde mental do ser humano, é um espaço que merece atenção dos pais e dos educadores, pois é o espaço para expressão mais genuína do ser, é o espaço e o direito de toda criança para o exercício da relação afectiva com o mundo, com as pessoas e com os objectos.
É pois importante e necessário, ajudar a criança a aprender e a brincar, partilhando as suas descobertas, estimulando-a a pensar criativamente, a transformar a agitação quotidiana em descobertas proveitosas.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

“Dentinho dentão”

“Ama-se na medida em que se busca comunicação, integração a partir da comunicação com os demais (Freire)

Ao “meu mais novo” caiu-lhe há dias um dente de leite. Foi uma festa! O rapaz ficou feliz da vida e, ao princípio, não sabia muito bem se havia de chorar ou rir tanta era a alegria. A festa continuou à tardinha quando chegou da escola e na manhã seguinte com o presente da “fada dos dentes”. Durante o dia, na escola, penso que ninguém reparou no “feito”. Foi pena. Não custava nada um “palavra afectiva” sobre o momento “super importante” na vida do “mais novo”.

O afecto é uma das ferramentas do acto de educar. Poder-se-á dizer que, a inclusão ou não do afecto no processo educativo definirá se a sala de aula funcionará como espaço de verdadeira aprendizagem ou como espaço para apenas fazer e concluir os níveis educacionais. Ter boas notas não quer dizer que o processo educativo decorreu de uma forma afectiva. E sem esta componente dificilmente a criança e o jovem aluno, estará em condições de participar na transformação do mundo ou de evoluir como ser humano.

Voltando ao “mais novo”: não era preciso tratá-lo com beijos, abraços ou procurar agradar-lhe. O que a escola precisa de fazer é, muitas vezes, “acordar” e tomar atitudes que a levem a sair da indiferença, porque essa “indiferença” é, justamente, a falta de afectividade.

Os educadores/professores não podem deixar de sentir o que acontece à sua volta, pois a capacidade de sentir torna-os seres privilegiados e com capacidade de transformar o mundo. Neste sentir há que perceber que não se pode ensinar pensando apenas na cabeça da criança já que o coração também é importante. É necessário que a escola se comprometa não apenas com o desenvolvimento cognitivo mas, principalmente, com o desenvolvimento sócio emocional.

O ensino é relacional e cada parte do processo é responsável pelo seu sucesso ou fracasso: professor, escola, meio social, aluno. A afectividade promove o respeito às diferenças, a motivação, o saber ouvir, o elogiar e o cumprimento dos objectivos com responsabilidade.

A afectividade é necessária na formação de pessoas felizes, éticas, seguras e capazes de conviver com e no mundo que as cercas. A escola tem que saber ouvir, valorizar e acreditar no aluno, dando abertura para a sua expressão.

Uma educação que não aborde as emoções na sala de aula traz prejuízos para a acção pedagógica, pois pode atingir não só o professor, mas também o aluno.
Os pais direi que é científico que a falta de afecto pode deixar marcas nas crianças para toda a vida marcas que podem incluir alterações psicológicas, psiquiátricas, neurológicas, imunológicas ou hormonais. Deixar, sistematicamente, de dar um abraço, recusar beijos, evitar um carinho, pode deixar marcas para toda a vida.

Ao meu “mais novo direi”: “Quanto o pai tinha a tua idade também me caíram os dentes. Sempre que me caía um, mandava-o par cima do telhado e dizia «dentinho, dentão, toma lá um podre dá cá outro são». Beijos filho”.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

“Batido de ritalina para toda a gente”

«O PHDA (Perturbação de Hiperactividade e Deficiência de Atenção) é um slogan publicitário à procura de um sindroma a procura de uma desordem em busca de uma causa». Jeff Victoroff
Provavelmente alguém irá dizer que, “estou a meter a foice em seara alheia” ao escrever sobre este tema. Desde já lhes digo que têm razão. Mas também lhes digo que começo a ficar cansado, perturbado, aflito, preocupado e… por aí fora, com este “sindroma/desordem” mental. E digo porquê: tudo o que é alteração comportamental na criança é PHDA e é tratado, quase sempre, com a famosa “ritalina” que se pensa que terá sido usada, pela primeira vez, pelos soldados nazis para aumentar a sua concentração no campo de batalha.
O diagnóstico para uma PHDA tem que ter quatro dos seguintes comportamentos durante 6 meses seguidos: enervar-se frequentemente; discutir frequentemente com adultos; recusar-se frequentemente a aceitar as regras e ordens dos adultos; frequentemente aborrecer, deliberadamente, os outros; culpar, frequentemente, os outros pelos seus actos; frequentemente ser sensível às críticas dos outros; estar frequentemente aborrecido ou ressentido e; frequentemente vingativo. (Não é isto ser, frequentemente, criança pergunto eu?)
Em plena era do avanço das neurociências, dos estudos sofisticados sobre a neuroimagem e a farmacogenética onde vemos o cérebro em pleno funcionamento, para não falar do desenvolvimento galopante da neurogenética, que está a chegar cada vez mais perto das alterações neuroquímicas que ocorrem no cérebro a cada instante, fico abismado com a facilidade com que as crianças, hoje em dia, são rotuladas e medicadas.  
E vai daí “batido de ritalina para todos”, pois é a solução para resolver os problemas emocionais e de comportamento.
Vejamos o que nos diz Peter Breggin: “descobri que quando dão ritalina a animais eles deixam de brincar, deixam de ser curiosos, deixam de socializar, deixam de fugir; o uso da ritalina gera bons animais de gaiola…nós estamos a gerar boas crianças de gaiola». Por outro lado uma nova descoberta publicada no Jornal de Psiquiatria da Academia Americana da Criança e do Adolescente, provou que a ritalina atrasa o crescimento das crianças. E mais: a ritalina é classificado pela Drug Enforcement Administration como um narcótico de Tabela II — a mesma classificação que a cocaína, a morfina e as anfetaminas, e vendê-la a crianças é um crime. No entanto fornecer ritalina para crianças, mesmo sem prescrição médica, é definido como "tratamento".
É dito pelos especialistas que a administração de drogas fortes nas crianças altera a mente e, na realidade, é uma forma de abuso químico, que ainda hoje é tolerado porque é formulado numa linguagem terapêutica.
Pronto: é desta que me vão chamar ignorante, provocador e… “não sabe o que diz”.
Mas, é ou não verdade, como no diz Hyperactive Children's Support Group, e The Food Commission  que a ritalina causa os mesmos problemas que deveria tratar – falta de atenção, hiperactividade e comportamento impulsivo?; que muitas crianças se tornam robôs, ficam letárgicas, deprimidas e introvertidas quando estão a tomar ritalina?; que a ritalina pode retardar o crescimento da criança ao romper os ciclos dos harmónios de crescimento libertados pela glândula pituitária?; que a ritalina geralmente causa graves distúrbios no cérebro da criança? (Pesquisas científicas mostraram que pode causar atrofia ou outras anomalias físicas permanentes no cérebro); que quando a criança pára de tomar a ritalina, pode ocorrer sofrimento emocional, incluindo depressão, esgotamento e até suicídio?; que  a ritalina reprime as actividades criativas, espontâneas e independentes na criança, fazendo com que se torne mais dócil e obediente e mais disposta a realizar tarefas rotineiras?
Como fazer então?
Em primeiro lugar é preciso ter cuidado com os “rótulos” pois a maioria das nossas crianças são falsos hiperactivos. Muitas são crianças que não se adaptam ao esquema rígido das escolas e, por isso, comportam-se como hiperactivos, mesmo sem ter disfunção bioquímica. Por vezes a “agitação” e “impulsividade” podem ter apenas a ver com problemas comportamentais ou ainda como reacção à sensação de inadequação na escola ou a mudanças repentinas de vida como, por exemplo, o divórcio dos pais.
Em segundo lugar há muito que defendo a necessidade de uma intervenção com base na psicoterapia junto da maioria das crianças que estão a passar por distúrbios e conflitos, isto porque, o afecto e o comportamento da pessoa são determinados pelo modo como ele se estrutura no mundo sendo a partir do processo terapêutico, que a criança tem a possibilidade de, digamos, de “re-significar” vivências e pensamentos podendo, assim, descobrir outras maneiras de ver a realidade e formas de viver mais satisfatórias aos objectivos deste viver.

A psicoterapia infantil visa auxiliar a criança e os pais e/ou professores/educadores, face a um menos satisfatório desenvolvimento emocional ou social da criança, construindo e reconstruindo ambientes que proporcionem tempo e espaço à criança e aos pais e/ou professores/educadores, para que pensem nas suas relações, nas suas escolhas, nas suas dificuldades, nos seus sonhos, nas suas possibilidades, espaço este no qual a criança possa experimentar, escutar, sentir, fantasiar…

Mais uma vez direi: sem relação afectiva não há vida. A psicoterapia é, em meu entender, um caminho afectivo.

É que, como nos disse João dos Santos, “não deve ser esquecido que a função racional e emotiva do ser humano assenta no que lhe deu origem e lhe confere progressivo aperfeiçoamento e sentido: a relação, o afecto e o sonho”