segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Regras, limites e afecto

“Afecto, afecto, só falas de afecto” – assim me confrontava há dias um amigo. E continuou – “ E regras e limites não são importantes e necessários à educação dos nossos filhos?”. Claro que sim. Mas, meu amigo, educar uma criança supõe conduzi-la ao racional e ao razoável sem negligenciar sua experiência afectiva.

As regras são importantes mas querer ensinar regras de comportamento sem proporcionar às crianças situações de interacção que levem a uma real tomada de consciência, pode ser perda de tempo, e pode dificultar a aquisição do pleno desenvolvimento cognitivo e afectivo. Por outro lado, estabelecer a disciplina é um acto de afecto e não um acto de poder.

“Mas tu não vês o que acontece nas nossas escolas? Estás cego ou quê? Hoje já ninguém respeita ninguém!” Calma amigo: é consensual, entre diferentes pensadores das relações humanas, a necessidade de se estabelecer limites claros e bem definidos para propiciar condições seguras de desenvolvimento para as crianças e jovens. Mas cuidado: sem abusos de poder, de violência física e moral, sob a capa da disciplina.

As crianças têm necessidade de um quadro estruturante, com referências e limites claros, para construir a sua personalidade. Todos os adultos, responsáveis pela educação, formação e desenvolvimento de crianças e jovens, têm o dever de assumir as suas responsabilidades, evitando de um lado, o autoritarismo e, de outro, o serem permissivos. Um professor, um pai ou mãe ou um educador deve fomentar as "regras do jogo social", do viver junto, sem impor uma violência subjectiva, nem uma não directividade mal entendida.

O desafio que se impõe está relacionado como a forma de exercer os limites e a disciplina com afecto.

Pais e professores devem usar a firmeza e a ternura para se fazer respeitar. Para isso é preciso que se reconheçam como competentes e acreditem que, na base da construção da disciplina e da colocação do limite, está o afecto e o legítimo interesse pelo outro, devendo agir na base de uma autoridade de “bons-tratos”, ou seja, uma autoridade que permita ser, existir, expressar emoções, aprender, amar, criar…, numa palavra, ao respeito, incondicional, à pessoa da criança e jovem.

“Pronto: podem fazer o quiserem”. Não, não podem: autorizar a ser não autoriza a fazer o que se quiser: proibições, limites e regras são indispensáveis, com a condição de incidirem sobre o que as crianças e jovens fazem e jamais sobre o que elas são.

Por outro lado há regras e limites que podem ser negociáveis, mas existem outros que devem ser inegociáveis. Regras inegociáveis são as ligadas a qualquer conduta que atente contra a dignidade humana dos próprios ou de outrem, bem como as regras éticas e legais. Regras negociáveis são as normativas ou convencionais que se constroem, por exemplo, em casa com a família ou com os alunos na sala de aula. (As primeiras são fundadoras do vínculo humano; as segundas, condicionadas às primeiras, permitem associar as crianças e jovens à sua elaboração e responsabilizá-los aos vínculos sociais que se constroem nas diversas situações da vida).

Para terminar e para que o meu amigo me entenda melhor, direi que estabelecer regras e limites traz consigo uma carga afectiva que é percebida pelo outro e que, portanto, desencadeia também uma resposta afectiva. Assim, estabelecer limites tem a ver com estabelecer regras, normas, que não são escolhidas aleatoriamente, mas que tem muito a ver com estados emocionais e com contextos socioculturais nos quais emergem.

Um abraço amigo e…interroga-me quando assim o entenderes, quanto mais não seja para podermos conversar!






2 comentários:

  1. Fantástico texto. Na sua essência está o verdadeiro respeito do professor/o adulto pelo aluno/a criança. Na minha opinião de mãe, e elemento activo de uma Associação de Pais, gostava muito de ver a generalidade dos professores ser capaz de pautar a sua atitude diária por esse respeito mútuo com os seus alunos! E não tenho dúvidas de que é por aqui que passa a verdadeira autoridade dos mais velhos sobre os mais novos, também nas escolas. Infelizmente a realidade escolar que conheço está tão distante ainda! Acho que ainda são muito poucos os professores que seguem orientações como esta, do seu texto, que subscrevo há vários anos: "Autorizar a ser não autoriza a fazer o que se quiser: proibições, limites e regras são indispensáveis, com a condição de incidirem sobre o que as crianças e jovens fazem e jamais sobre o que elas são..."

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  2. Por cá ficámos apaixonados, adoro!Gostava muito de ter o prazer da sua visita numa Tertúlia a combinar para pais/educadores, pode facultar-me um email? o meu endereço é sonia.rcarvalho@bananasalgada.pt - www.bananasalgada.pt, Sorrisos, Parabéns é uma até já

    Sónia Carvalho

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