sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Brincar e Jogar: contributos para o desenvolvimento

          Já lá vão uns anitos é certo, mas ainda me lembro daquelas brincadeiras que fazia quando tinha tempos livres. Ele era o jogo do pião, ele era a apanhada, o berlinde, a cabra cega, aos reis e às rainhas, à corrente eléctrica, ao lenço, à rolha, às touradas, ao Zé da Mitra e claro, ao futebol e ao hóquei (sem patins), tendo como bolas os pobres marmelos em crescimento que, coitados, não tinham culpa  do dinheiro não chegar para comprar as ditas.

         Brincava muito jogando a tudo um pouco. Claro que de vez em quando ouvia um "ralhete" quando a brincadeira era em demasia. Claro que que também tinha as minhas obrigações, também ajudáva os meus pais, também fazia os meus deveres escolares(?). Mas bincava  e  jogava.(E ainda  brinco e jogo).

         Hoje a criança brinca e joga menos, ou melhor, o jogo está a ser considerado, erradamente, por muitos adultos, como perda de tempo no caminho que há-de levar a criança a engenheiro, a doutor, a arquitecto...

         A utilização do jogo é um valor directo no desenvolvimento físico, intelectual e social das crianças. O jogo é para a criança algo de bastante profundo. Estudos realizados em diversas escolas e levados a efeito por psicólogos especializados, têm mostrado que o jogo além de ser um exercício intelectual, é uma linguagem da vida emocional, e um dos principais meios para a criança pôr as suas fantasias em relações cada vez mais ligadas com a realidade causal e o mundo objectivo. E basta observarmos as crianças quando brincam para verificarmos, através da linguagem falada, que o jogo é para elas um meio de análise e de controle do sentimento e do pensamento.

         A criança fica facilmente ansiosa; os seus medos de perda de amor, perda de segurança e as suas ansiedades sobre os sentimentos fortes e ambivalentes, tornam-se rapidamente visíveis e aparecem sob a forma de hostilidade, recusa ou ambas. Os seus desejos entram em conflito com as exigências do ambiente; a sua vida imaginativa contém receios, ameaças secretas e não expressas.

         É nestas alturas que o jogo é para a criança um meio de expremir, concretamente, as fantasias do seu espírito, levando-a a exteriorizar emoções através do único meio de que dispõe para pensar, sendo um elemento fundamental na capacidade de, mais tarde, se aceitar a si mesma e, consequentemente, aos outros.

         É preciso que os pais e os educadores em geral, tenham consciência de que o jogo não é apenas para ser tolerado mas sim encorajado e visto com agrado. A família e a escola devem servisse do jogo da criança igualmente para a perceberem e para a ajudarem.

         Infelizmente muitos são ainda os pais e educadores que têm dificuldade em deixar as crianças brincar livremente, talvez porque no fundo de si mesmos não aceitaram a criança e temem    as suas fantasias;  talvez porque têm aversão à desarrumação e aos "estragos",  preferindo os brinquedos muito arrumadinhos, muito estimados, tão estimados que a criança não pode brincar com eles; talvez porque consideram o jogo e a brincadeira uma perda de tempo e estão ansiosos por a criança trabalhar bem e muito, de forma a  progredir rapidamente.

         Brincarem com ela nem pensar. "-Pai, brinca comigo ao macaquinho chinês!" ; "-Näo tenho tempo."; "- Estou cansado, brinco outro dia."; "- Só pensas na brincadeira. Vai mas é fazer os trabalhos da escola e deixa-me em paz".

         Claro que para estes pais, o jogo é algo desnecessário como desnecessário é o amor. Para eles o único objectivo da vida é o trabalho, vivendo toda uma vida de cabeça virada para baixo como a pobre da formiga.

         É pois necessário insistir em que as crianças precisam e muito, de tempo e espaço para os seus jogos, para as suas brincadeiras. Mesmo que o espaço seja uma raridade em muitas casas e em não poucas escolas, pelo menos um canto e muito tempo, têm de lhes ser concedidos.

         Atenção pois: quando uma criança não joga e não brinca é todo o seu desenvolvimento desde o afectivo, ao físico, ao intelectual, que está a ser atrofiado.Mas mais: o jogo é condição fundamental para o desenvolvimento infantil, mas  também o é para uma vida em busca da felicidade.

         Jogar é viver, mas viver - é preciso dizê-lo - também é jogar.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O Lúdico e a Criatividade

Brincar é o mundo da criança! Mas, tanto quando possível, deve brincar de uma forma livre e natural.
Ao permitir que tudo aconteça naturalmente como quem respira, a criatividade fomenta-se na criança. Não devemos esquecer que quanto mais discreta é a presença do educador, mais desinibida será a actividade da criança.
É a própria criança que descobre o seu modo de agir e de se exprimir, bem como o material e técnica que melhor se adaptam à sua própria expressão. Deve-se também dar uma série de materiais e de espaços, para que a criança desenvolva a sua criatividade. A criatividade desperta-se através do fazer, da experimentação constante.
O adulto, na sua acção de educador terá de ser autêntico perante a criança, tendo esta mais facilidade em aceitá-lo e em compreendê-lo, podendo estabelecer-se uma boa relação afectiva entre os dois. O importante é toda esta relação bilateral, decorrer num clima não directivo, liberto e libertador, que permita que a criança actue, se exprima espontaneamente e criativamente em contacto com os outros. A criatividade apela para uma pedagogia não directiva ou pelo menos flexível e aberta, que permita que seja a criança a descobrir o seu modo de agir e de se exprimir.
A capacidade criadora significa flexibilidade de pensamento e fluidez de ideias, podendo ser também a amplitude de conceber ideias novas.
A arte pode-se considerar um processo contínuo de desenvolvimento da capacidade criadora. Dando várias oportunidades às crianças estas têm a possibilidade de desenvolver o pensamento criador, na experiência artística.
Para que a criatividade se desenvolva é necessário que a criança explore, investigue e descubra. Através da experimentação, a criança exercita as suas faculdades sensoriais através dos diversos materiais, trazendo-lhe não só a alegria da actividade, mas proporcionando-lhe uma visão mais clara do mundo que a rodeia.
Não nos devemos preocupar em motivar as crianças para se comportarem de forma criativa, mas sim proporcionar-lhes caminhos onde a sua curiosidade os levem à exploração.
É sabido que a expressões permitem à criança exteriorizar os seus sentimentos, exprimindo os seus problemas afectivos, que na maioria das vezes não consegue exprimir oralmente, vai assim conhecer e explorar as coisas, descobrindo-as, fazendo com que esta crie e acrescente ao real, coisas da sua imaginação.
A criança é por natureza criadora. Está repleta de impulsos, tensões, de sensações, de sentimentos, desejos, necessitando de se expandir livremente. Ao observarmos uma criança em actividades livres, constatamos que esta é essencialmente expressiva e criadora. Ao possibilitar-se meios para que a criança actue livremente e a motivação remova a situação inibitória inicial, é como se se abrisse a porta para a saída da tudo aquilo que estava acumulado no íntimo do seu ser.
"A expressão criadora é o acto que vem de dentro, desenvolve a personalidade, forma o seu carácter e faz dela um ser sociável.” (STERN 1976)
É o ambiente que proporcionamos à criança que vai favorecer ou desfavorecer a capacidade criadora.
"Sem liberdade não há expressão!"( GONÇALVES 1976) Quantas vezes foi dita esta frase? Muitas! No entanto poucas vezes foi compreendido o seu verdadeiro significado. Quanto mais liberdade, mais responsabilidade e sendo assim aparece-nos a disciplina. Ao falar em disciplina, outras palavras vão surgir: segurança, tranquilidade, liberdade e responsabilidade.
A escola, as AECs, os ATLs sem dar conta, impõem modelos pré-concebidos que acabam por sufocar a potencialidade criadora que cada criança em si contém  e não há nada que substitua o que foi destruído pela pressão do adulto.
O Educador tem um papel fundamental. Se o adulto intervém na criação da criança não há dúvida que a altera, quer ele actue sobre a intenção ou sobre a maneira de executar o seu desenho. Na realidade, há duas atitudes; uma é actividade espontânea da criança, outra a actividade orientada. Na primeira pode o adulto aprender com a criança, a criança com o adulto ou um aprendizagem recíproca, na segunda é essencialmente a criança a aprender com o adulto. Estas duas atitudes, ao serem bem compreendidas e desenvolvidas, possibilitam a liberdade criadora, proporcionando o equilíbrio que nos fala Stern: equilíbrio entre acção livre e acção educativa. Para as crianças a arte, pode constituir o equilíbrio necessário entre o intelecto e as emoções, sendo esta um apoio que procuram naturalmente ainda que de modo inconsciente.
A exteriorização de toda a vida interior é a expressão que, será tanto mais rica, quanto maior as possibilidades de encontrar um meio favorável. Seja qual for a estratégia utilizada: movimento, canções, jogos, pintura ou outras actividades, a expressão "não é um espectáculo para os ouvidos, mas sim uma expressão de sentimentos".( STERN 1976)