segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Sucesso/insucesso escolar e o afecto


  De um modo geral o facto de um aluno repetir um ano, significa que esse aluno não conseguiu atingir uma determinada meta ou um determinado nível de aprendizagem, isto é, a criança não é classificada como tendo adquirido aquele mínimo de aquisições considerado necessário para transitar de ano.
            Evidentemente que neste caso, insucesso escolar é equivalente a repetência. Sobre este assunto afirma Pires (1989) "a este simplismo se tem reduzido a ideia de insucesso escolar. Será no entanto assim? A resposta...é negativa. Na verdade a problemática do insucesso escolar é complexa e multiforme".
            Não deixam de nos questionar as crianças que, embora atingindo as metas de aprendizagem determinadas pelos programas, manifestam uma atitude de repulsa face à escola ou a qualquer coisa que lhes lembre a situação escolar, ou aqueles que, para se tornarem bons alunos ou para manterem o estatuto de bons alunos, criaram através da experiência escolar, um tipo de personalidade individualista, competitiva e, portanto, a escola foi um meio de cultura da personalidade que, em termos de avaliação humana, resulta em fracasso escolar. Questionável é ainda o sucesso daqueles alunos que, embora com bom rendimento ao nível das metas programáticas, ao saírem da escola e tendo por base a experiência ali realizada, se encontram desenraizados da sua cultura de origem e consequentemente vulneráveis a futuras desadaptações sociais.
Um aspecto a ter em consideração no sucesso escolar, prende-se com a afectividade, a qual tem uma profunda influência sobre o desenvolvimento intelectual, podendo acelerar ou diminuir o ritmo desse desenvolvimento. O desenvolvimento intelectual é considerado como tendo uma componente cognitiva em paralelo com outra afectiva. Esta inclui sentimentos, interesses, desejos, tendências, valores e emoções em geral. O afecto apresenta várias dimensões, incluindo os sentimentos subjectivos como o amor, raiva, depressão e aspectos expressivos como sorrisos, gritos, lágrimas. O afecto desenvolve-se no mesmo sentido que a cognição ou inteligência, sendo responsável pela activação da actividade intelectual. Com as capacidades afectivas e cognitivas expandidas através da contínua construção, a criança torna-se capaz de investir afecto e ter sentimentos validados nela própria. Neste aspecto, a auto-estima mantém uma estreita relação com a motivação ou interesse da criança para a aprendizagem, sendo o afecto o principal elemento da auto-estima. Após o desenvolvimento do vínculo afectivo, a aprendizagem, a motivação e a disciplina como meio para conseguir o auto-controle da criança e seu bem-estar são conquistas significativas. A criança que se sente amada, aceite, valorizada e respeitada, adquire autonomia, confiança e aprende a amar, desenvolvendo um sentimento de auto-valorização e importância. É que, “ só se tem motivação para alguma coisa depois de se sentir a motivação de alguém em relação a si”. Eduardo Sá (1995). A auto-estima é algo que se aprende. Se uma criança tem uma opinião positiva sobre si e sobre os outros, terá maiores condições de aprender. O sentimento de "não sou ninguém" levará a criança a não se esforçar muito, a não ter desejo de aprender, a ficar indiferente diante do êxito ou do fracasso. E esse sentimento pode criar problemas de aprendizagem e de comportamento.
É fundamental que a qualidade de vida para as crianças signifique que, acima de tudo, elas se sentem bem-vindas e aceites pela sociedade, que a sua presença seja reconhecida e tida em consideração, que sejam visíveis, que se sintam parte dessa sociedade, que as suas necessidades sejam respeitadas, e que se sintam amadas e desejadas. Estes pressupostos evitam o seu insucesso escolar mas, sobretudo o seu insucesso na vida.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Uma ideia de projecto escolar

            Entendemos que o desenvolvimento do indivíduo se dá de acordo com as experiências vividas, de acordo com as situações que ele tem possibilidade de experimentar. Por exemplo, indivíduos que têm contacto mais frequente com a música e a arte de um modo geral, têm mais hipóteses de se interessar por estas formas de expressão que outros que não têm a mesma oportunidade.
Significa dizer que as experiências que o indivíduo vive, antes e durante a escola, são relevantes para o seu desenvolvimento independentemente de sua idade. Portanto, a escola não é a única, mas uma das mais importantes experiências no desenvolvimento do ser humano.
Nesse sentido é necessário valorizar a experiência que o educando tem acumulado na sua vida para dela partir para uma sistematização mais rigorosa do conhecimento. Isso não sugere ficar neste ponto de partida nem tão pouco ignorá-lo.
A organização da escola, determinada por conteúdos pré-estabelecidos, inquestionáveis na sua sequência, com acções pedagógicas que privilegiam a memorização, não favorece a construção plena do educando. A argumentação de que se precisa "dar os conteúdos" até o final do ano lectivo tem favorecido que, enquanto professores, deixemos de valorizar aquilo que é essência do trabalho educativo, a capacidade do apreender, do compreender, do instrumentalizar-se para aprender. Não se trata de desmerecer os conteúdos e nem de minimizar o trabalho na escola. Ao contrário, trata-se de trocar o "faz-de-conta que se ensina e o faz-de-conta que a criança aprende" pela preocupação real, sincera, de facto comprometida com a construção desses conhecimentos, tendo por base o "preparar para a vida".
O desafio que se nos coloca é o de reflectir e fortalecer o papel social da escola através de um processo de construção do conhecimento, actuando na formação do indivíduo em toda a sua globalidade, sem perder de vista nenhum de seus estágios de formação.
Penso que se torna necessário elaborar projectos escolares que, partindo da escola e tendo em consideração a diversidade dos alunos, possam recorrer a propostas flexíveis e variadas de ensino /aprendizagem para que os alunos tenham oportunidade de atingir não só os saberes e culturas veiculadas pela escola mas, igualmente, partindo do seu meio sócio - cultural, dos seus saberes, das suas tradições específicas, consciencializar a criança para as suas raízes, contribuindo para o seu sucesso escolar e na vida.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

A criança e a violência (II)

A violência, perante a criança, acontece, na maioria dos casos, no anonimato da família e algumas vezes, com a conivência de familiares e de vizinhos. Muitos dos maus tratos acontecem em famílias normais, não pobres.
Romper o silêncio é difícil. Até porque quem agride é alguém de quem se gosta. Uma criança que vive numa situação de violência frequente banaliza, muitas vezes, os próprios actos de violência. Isto não quer dizer que não sofra, quer dizer que tem uma resistência diferente.
Os maus tratos dentro da família são aqueles que piores consequências têm na criança, dado que se verifica uma quebra profunda de confiança e uma perda de segurança em casa, o que constitui uma ameaça profunda ao seu desenvolvimento.
Nos últimos anos, a investigação tem demonstrado que a vitimização infantil, em especial os maus tratos intra-familiares, leva a consequências a curto e longo prazo no que concerne ao desenvolvimento emocional, interpessoal e a problemas no comportamento da criança, e que os efeitos dos múltiplos maus tratos estão associados, à depressão, à ansiedade, ao isolamento, aos comportamentos hiperactivos e anti-sociais, à agressão...
Há muito que está assumido que as crianças vítimas de maus tratos físicos ou psicológicos, vive num contexto de violência doméstica. É nosso entendimento que aquelas que, nestas famílias, não são batidas diariamente estão em perigo pelo facto de viverem em ambientes disfuncionais. Uma percentagem importante destas crianças poderá tornar-se abusadores ou vítimas.
A quantidade de situações de violência doméstica é enorme, existindo muitas mulheres (e alguns homens) vítimas de maus tratos físicos e/ou psicológicos, insultos, humilhações e intimidações, isolamento da família e amigos, controlo económico, ameaças e agressões diversas...
A nossa realidade mostra-nos ainda que os agressores são, na maior parte das vezes, indivíduos com problemas de álcool e drogas, e que a grande maioria das situações que prefiguram casos de violência doméstica, são exercidas sobre mulheres pelos maridos ou companheiros.
Os maus tratos a crianças e jovens constituem, pela sua transcendência, um dos problemas mais importantes entre os que afectam a qualidade de vida na infância e na adolescência, com repercussões a vários níveis, designadamente no futuro das pessoas envolvidas.
 
           Álcool, consumo de drogas, desemprego e problemas de extrema pobreza são, geralmente, situações que acabam por se virar contra a criança. Quanto mais difícil é a situação familiar maior é o risco da criança ser maltratada.
O abuso familiar contra crianças e jovens pode trazer consequências a médio e a longo prazo, capazes de causar danos ao seu desenvolvimento físico e mental.    
Sabe-se hoje que a criança maltratada, se não for tratada correctamente para diminuir as cicatrizes psico-emocionais, poderá tornar-se uma agressora na idade adulta.
É pois indispensável que a intervenção técnica junto das crianças e jovens em perigo seja cada vez mais humanizada e individualizada, olhando para elas com a certeza de que cada uma tem direito a uma família natural ou adoptiva, e a um projecto de realização que respeite a sua identidade e personalidade.

sábado, 22 de janeiro de 2011

A criança e a violência (I)

A violência de que hoje tanto se fala sempre existiu, quer a nível social quer a nível familiar. Em bom rigor não existem estudos rigorosos que nos permitam dizer, com algum grau de certeza, se tem vindo a aumentar ou a diminuir. O que se sabe é que há uma maior consciência do fenómeno e as situações são hoje mais conhecidas, deixando-nos a sensação de um mundo em constante violência.
A Humanização das sociedades tornou-nos menos tolerantes em relação à violência; os direitos das pessoas passaram a ter prioridade e a violência é hoje cada vez menos aceitável.
Não se conhecem todas as causas que estão na origem da violência, mas sabe-se que esta vitima, numa primeira fase os adultos, que não sendo capazes de a ultrapassar, a transferem para as crianças que se tornam vítimas em segundo grau.
A vertente sociológica valoriza as condições económicas, sociais e culturais, enquanto a vertente psicológica dá um especial relevo aos factores psicológicos e às características da personalidade dos pais.
Não há dúvida que a falta de afecto e de sentimentos de pertença a uma família, a necessidade de se sentir amado, a pobreza, o meio social desfavorecido, a falta de princípios orientadores, a desestruturação familiar e a forma como a sociedade está organizada, podem ser factores conducentes a actos de violência.
Para combater a violência, os pais e educadores devem transmitir às crianças o valor da vida humana, devem educar para a cidadania preparando as novas gerações para a resolução dos problemas através do diálogo e da argumentação.
As crianças e os jovens devem ver diminuída a violência que recai sobre si e devem poder gozar de ambientes tranquilos.
O espaço em que vivemos tem que ser mais apelativo. As escolas têm que ser mais agradáveis, nomeadamente os seus recreios onde as crianças e os jovens devem poder contar com animadores de “rua”, que oiçam as crianças, que as orientem no sentido de valorizar os seus tempos livres, orientando os seus impulsos agressivos para actividades agradáveis e saudáveis, dando-lhe oportunidade de crescimento, atendendo aos seus interesses superiores, à sua privacidade...

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Ambientes educativos - educação formal, não formal e informal(III)

Educação informal

            Por educação informal entende-se aquela que é adquirida indiferenciadamente, através das relações estabelecidas com os outros e com o meio, sem preocupações de planificação ou de ordem pedagógica.
Como exemplo desta educação, poderemos salientar a brincadeira livre e espontânea da criança, realizada sem a companhia de um adulto, num tempo, digamos de independência, de aventuras, de actividades secretas em partilha com os colegas, ou seja numa socialização horizontal.
O tempo de casa à escola, quando a criança faz este percurso sozinha ou na companhia de colegas, é um tempo rico para as actividades de índole informal.

            Perante esta análise sobre a educação formal, não formal e informal, poderemos concluir da importância que os diversos ambientes educativos têm na aprendizagem e no desenvolvimento harmonioso.
            Assim, se por um lado uma das funções primordiais da escola é assegurar a aquisição de conhecimentos e competências básicas necessárias, tendo em consideração cada momento histórico e situação cultural, por outro lado as aprendizagens desenvolvidas no distanciamento institucional fase à escola, em relação com o meio vital da criança, num tempo especial de independência, de aventura, de projectos secretos partilhados com colegas, num tempo de traquinice, de socialização horizontal, ou ainda a realização de actividades lúdicas organizadas por instituições especializadas de forma a animar os tempos livres, levam a aquisições significativas e diversas  que conduzem à assimilação de valores fundamentais à vida quotidiana.
            Os efeitos educativos produzidos nos diferentes ambientes, incidem conjuntamente no processo educativo global de cada criança.
            Segundo Dewey, a educação pressupõe uma constante reestruturação das experiências. Cada experiência educativa reforça e facilita, contradiz ou nega as outras ou seja, cada aquisição tem por base a precedente e condicionará a futura.
            As vivências de cada criança, tanto na escola como na família ou ainda brincando livremente ou em actividades programadas, repercutem-se no processo educativo global.
            Assim sendo, importa que exista uma curta distância afectiva entre a família, a escola e as instituições educativas não formais mas, igualmente, que exista uma coordenação entre elas de forma que não actuem isoladamente, sentindo-se auto suficientes, duplicando esforços, reduzindo recursos ou, simplesmente sobrecarregando as crianças.
            Os tempos livres têm que ser compatibilizados tendo em atenção a escola, a família, as instituições não formais e os tempos pessoais e auto definidos. A criança necessita de dispor de tempo livre, em que não esteja “comprometida” com nenhuma ocupação regulamentada e orientada pelo adulto, seja ela de âmbito formal ou não formal.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Ambientes educativos - educação formal, não formal e informal(II)

Educação não formal

Na educação não formal os objectivos também estão ligados à socialização do indivíduo dentro da sociedade, sendo explicitamente definidos, possuindo princípios intencionais, diferenciando-se no meio e na forma como os aplicam. Actuam de forma difusa, menos hierárquica e burocrática.
A educação não formal procura o equilíbrio entre a anarquia e a ordem, na qual as suas actividades podem ampliar não só os pequenos grupos como também  toda a comunidade sem determinação de idades. Muitas vezes as instituições não formais exigem uma estrutura interna muito bem organizada principalmente por trabalhar com actividades variadas e com diferentes tipos de público.
As actividades geralmente são voluntárias, muitas vezes pagas pelos seus participantes, tendo uma ideologia de acção própria, com objectivos específicos e duas funções fundamentais em relação à escola e à família ou seja, a de substituição e a de complementaridade.
Relativamente à função de substituição, centraliza-se em torno da vigilância, do aliviar as disfunções escolares, na substituição parcial ou total da família e no acolhimento daqueles que, por qualquer motivo, abandonam a escola. Por sua vez a função de complementaridade pressupõe a criação de espaços para a socialização, a formação para e através do lazer, a facilitação do desenvolvimento de projectos próprios, bem como o cultivar da diversidade.
A educação não formal como órgão não tem uma centralização unificada institucionalizada que determina currículos e a fiscaliza, estando com a família e a escola, configurando o universo educativo da infância.
São exemplos de ambientes no âmbito da educação não formal: actividades extra-escolares realizadas fora da escola; instituições de educação de tempos livres; instituições que desenvolvem actividades especializadas e que tenham a ver com o lazer; actividades educativas de férias; actividades extra-escolares ou complementares da própria escola; equipamentos e recursos de carácter cultural e de carácter lúdico, entre outros.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Ambientes educativos - educação formal, não formal e informal (I)

Educação formal

A educação no sentido amplo é sinónimo de socialização do indivíduo e compreende todos aqueles processos institucionalizados, ou não, que visam transmitir determinados conhecimentos e padrões de comportamento a fim de garantir a continuidade da cultura e normas da sociedade.
A sociabilização promovida pela escola implica, na maior parte das vezes, levar a criança para dentro de uma vida pré-determinada, de um mundo pré-estabelecido: a vida e o mundo dos adultos e das coisas sérias. Significa transmitir à criança valores já prontos, na construção dos quais ela não teve (nem terá) qualquer participação, “ilegitimando” a cultura infantil, podendo mesmo negar a existência desta cultura. Perrotti (1982). Sob o paradigma da sociabilização, a instituição escolar converte-se em aparelho ideológico do Estado. Althusser (1980)

A educação deve,(...) procurar consciencializar o indivíduo para as suas raízes, a fim de dispor de referências que lhe permitam situar-se no mundo, e deve ensinar-lhe o respeito pelas outras culturas.  (Delors, 1997, p.42)

Educação formal tem como significado a educação escolar, a qual se integra num sistema regular de ensino e aos diversos níveis, desde o pré-escolar até aos estudos superiores, promotora de amadurecimento psicossocial e do aprender erudito.
A educação formal tem objectivos claros e específicos como seja, socializar o indivíduo dentro das normas da sociedade. A escola e a universidade geralmente simbolizam a educação formal.
A escola como órgão depende de uma linha educacional centralizada com um currículo, sendo esta linha determinada a nível nacional, fiscalizada pelo ministério da educação, através de uma estrutura hierárquica.
A escola divide-se em pequenas fracções, baseadas na idade cronológica onde se formam as turmas pelos diversos anos de escolaridade; as turmas estão condicionadas a normas de comportamentos próprios como: horário, conduta, disciplinas específicas para cada aluno, etc. A educação neste sentido tem exigências claras como a competição e a aquisição, as quais fazem parte do dinamismo escolar. A educação tem que provar, por meio de instrumentos diversos, o que o aluno aprendeu, sendo avaliado por notas ou conceitos, com "punições" para aqueles que não têm uma boa avaliação, punições como por exemplo repetir de ano.
A educação nesse caso não é uma escolha pessoal voluntária, já que o educando não participa das actividades escolares por determinação própria. Esse tipo de educação é obrigatório por lei, sendo da responsabilidade da família e da sociedade.