quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

A propósito de notícias alarmantes!

Fico preocupado com notícias alarmantes. Fico porque, normalmente, causam um impacto negativo junto das comunidades. Quando se trata de notícias sobre e com crianças, a minha preocupação é ainda maior. Por vezes fico com a sensação que algumas pessoas gostariam de ver algumas crianças, as ditas mal comportadas, internadas em “prisões para pequeninos”. O alarido não é bom conselheiro nem resolve situações.
Não tenho dúvidas de que o mau trato entre iguais existe nas nossas escolas. Um estudo realizado no nosso País mostrou que, aproximadamente um em cada cinco alunos (22%), entre seis e dezasseis anos, já foi vítima de mau trato pelos seus pares e na escola. Este estudo avaliou, igualmente, que o local mais comum da ocorrência de maus-tratos é o pátio de recreio (78% dos casos), seguido dos corredores (31,5% dos casos) (Almeida, 2003).
Também não há dúvida que estas situações não são brincadeiras ou simples desentendimentos pontuais entre crianças e jovens. Esta problemática tem implicações do ponto de vista da prática educativa, e as suas diferentes manifestações devem preocupar os pais, os professores e os educadores.
No entanto, nem todas estas ocorrências podem ser caracterizadas como mau trato entre iguais. Alguns episódios esporádicos e brincadeiras próprias de cada idade, mesmo com comportamentos por vezes inadequados, não trazem consequências para a auto-estima e fazem parte do desenvolvimento e da socialização da criança e do jovem. Agressividade e violência não são a mesma coisa.
O que importa é estar atento. TODOS.
Mas não peçam “prisões” para as nossas crianças “mal comportadas”. Também as não podemos, pura e simplesmente, “banir” da sociedade. “TODOS DIFERENTES TODOS IGUAIS”, não pode ser um simples anúncio publicitário. O comportamento desadequado de algumas delas (e de muitas outras pessoas na sociedade), têm origens bem conhecidas, e são essas que necessitam de ser “atacadas”. Não as crianças. Estas precisam de ajuda para crescer, para viver e serem felizes.
Importa ter presente que é importante, que o direito ao respeito e à dignidade pela criança e pelo jovem  são valores fundamentais, sendo a educação entendida como um meio de promover o pleno desenvolvimento da pessoa, bem como prepará-la para o exercício pleno da cidadania. Todos queremos e desejamos, que as escolas sejam ambientes seguros e saudáveis, onde crianças e jovens possam desenvolver, ao máximo, as suas potencialidades intelectuais e sociais, não se podendo admitir que sofram actos de violência que lhes tragam danos físicos e/ou psicológicos; que testemunhem tais factos e se calem para que não sejam também agredidos e acabem por achá-los banais ou, pior ainda, que diante da omissão e tolerância dos adultos, adoptem comportamentos agressivos ou, simplesmente, achem que a vida é uma vida de violência e, como tal, não vale a pena viver.
Todos desejamos que os nossos filhos cresçam em ambientes protegidos, motivadores, aliciantes... Mas vamos lutar por isso com serenidade, com bom senso e com respeito por todos. É que o “dedo acusador” nunca deu bom resultado.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

A escola… “outro” mundo da criança

"A escola tem uma função essencial no crescimento. Crescer e aprender são, no fundo, dum ponto-de-vista psicológico, a mesma coisa. Não é possível aprender sem crescer e, talvez por isso, seja - para uma criança como para nós - tão difícil aprender." ( Sá, Eduardo )

Poderia começar esta conversa por… “era uma vez”.
“Era uma vez uma criança alegre e bem-disposta que, diariamente, corria que fosse verão ou inverno, estrada fora a caminho da escola…”, e continuaria: “ e assim se fez menino, e assim se fez homem”. Claro que também poderia escrever: “era uma vez uma criança triste e angustiada”, em vez de alegre e bem disposta!
A escola é sem dúvida um lugar privilegiado para que a criança aprenda. Ela própria mantém, em relação à escola, essa expectativa, o encontro com o conhecimento, o espaço capaz de lhe proporcionar a satisfação da sua curiosidade quase que inesgotável. Mas a escola é também separação e desconhecido e como separação cria conflito e como desconhecido suscita medo e curiosidade. Mas, acima de tudo, a escola é relação, relação com os outros, os companheiros professores, relação consigo mesma com as suas perguntas e as suas respostas, que a levam a pensar, a aprender e a crescer.
A escola não é (não deve ser) apenas a transmissão do conhecimento vazio de emoção e afecto, porque a criança valoriza o saber pela maneira como o pensa e o sente, assim a escola tem muito a ver com o gostar. Gostar de aprender, gostar de estar e de lá voltar, gostar de si e gostar dos outros.
Para caminhar neste novo espaço desconhecido que pode ser pleno de experiências, e não esqueçamos que primeiramente se aprende pela experiência e pela acção, mas que sempre se mistura a emoção, a criança terá como companheiros, primeiro o educador, depois o professor, capazes ou não de a compreender, de se dar e de se encontrar, para com ela aprender e assim poder ensinar. Disponíveis para entender cada aluno e encontrar a medida do seu crescimento, anterior e interior, dele partir para continuar a construir, a ajudar, a organizar e a facilitar o seu crescer, o seu aprender, entendendo que " querer aprender será sempre diferente de querer ser ensinado. Que aprender implica relacionarmo-nos em dois mundos - externo e interno -, retirando do primeiro coisas a estruturar num espaço mental, dando-lhe sentido na forma de pensamentos, misturá-los, modificá-los à luz das experiências emocionais e aplicá-los com significado e adequadamente a outras e novas situações criadas em cada um destes espaços ou na sua dependência." (Strecht,1995).
A escola enquanto espaço e sobretudo tempo, possui uma importante função que vai para além da função social e, por ser dinâmica e viva, deve ser capaz de propor a mudança não deixando de ser o lugar humano dos sonhos e das utopias que existem em cada aluno e… em cada um de nós.
A escola faz-se todos os dias com inteligência, com competência, com bondade e com firmeza, por parte de todos que dela fazem parte. Sem nenhuma excepção.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A criança cresce e aprende no jardim de infância

A criança ao entrar para o Jardim de Infância já assimilou e trabalhou internamente uma quantidade significativa de informação, já domina um grande grupo de conhecimentos, capacidades físicas, maneiras de comunicar o que sentem e o que pensa e uma série de identificações com o seu meio familiar ao qual se sente estritamente ligada e a tornam capaz de continuar a crescer.
A criança de 3 a 6 anos tem uma vontade insaciável de explorar, de agir sobre as coisas e de pensar as suas acções. Ela vai sendo cada vez mais capaz de reflectir sobre os seus comportamentos e a sua memória vai se tornando mais duradoura, pode agora pensar a acção e está até mais interessada em pensar a explicação dessa acção, para formar planos de acção futura. No seu comportamento deixam de ser visíveis os esboços do seu pensamento porque os planos de acção vão sendo também interiorizados progressivamente.
Esta percepção do mundo que a rodeia, em conjunto com a fantasia, a imitação e a representação, que lhe serve para pensar o real, para o compreender intimamente, é o canal privilegiado para aprender, por partes, em passos curtos, de processos e imagens mentais, em formas de registo mnésico que possibilitam a acomodação e uma busca constante de equilibração. Mas para que o processo seja de crescimento global e harmonioso, exige um paralelo crescimento afectivo, em que se jogam a segurança do poder explorar um território cada vez mais vasto e investi-lo, percorrendo-o até ao seu "horizonte", tendo como base alguém que neste novo espaço alimenta e acalenta a relação, a educadora. Porque muitas vezes a criança vive este espaço de jardim como vive, ainda, o lar, nele também vive o adulto como vive a mãe.
O papel do educador é assim muito afectivo, pois como incentivador das experiências, proporcionador das actividades e facilitador de meios e materiais estimulantes a serem moldados ao sabor da descoberta e da representação do mundo, para a sua compreensão, ele tem que se envolver e investir na relação com a criança, proporcionando liberdade de escolha, respeitando a sua vontade incentivando a sua participação, tendo em conta  a sua disponibilidade e a fase de maturação que  lhe apresenta, para não exigir de mais e conhecer e amparar, o que a criança é capaz de pensar.
O raciocínio da criança, a sua atenção e percepção são condicionadas pelo seus interesses e fixam-se nos estados resultantes da acção- centração- não a deixando perceber o todo.
A educadora poderá sempre estar atenta às manifestações da criança, muitas vezes inconscientes, que poderão modificar o investimento nas acções e a maturidade que apresenta para participar activamente nas experiências. A criança, porque vai descobrindo cada vez melhor o seu corpo, percorre estas idades sensível às diferenças que apresenta anatomicamente em relação ao outro sexo, investe o seu pensamento no que é afinal ser menino ou menina, porque é que o outro tem e eu não tenho e enquanto vai respondendo a estas suas questões vai se confirmando, se esta fase for bem resolvida dela sairá mais forte e pronta a iniciar caminhos diferentes do outro sexo.
A sua posição no triângulo familiar, leva-a a questionar donde vêm os bebés, como é que nasceu,  indo  buscar respostas no brincar aos pais e às mães, no jogo simbólico. O desvendar destas curiosidades intensas da criança poderá ser acompanhado pela educadora no contar de histórias, dando forma aos pensamentos da criança, evitando bloqueios intelectuais por inibição da curiosidade que mais tarde ocasionarão dificuldades de aprendizagem.
A criança cresce brincando. O seu mundo está povoado de brinquedos e com eles ela convive no imaginário, no fantástico, num espaço de transição entre o interior e o exterior, o campo da actividade simbólica, onde é poderosa, onde tudo controla. «A realidade sem elementos fantasiados é dura, fria e emocionalmente não satisfatória, mesmo quando parece vir ao encontro das nossas necessidades. Se queremos ter uma vida que nos dê satisfação, então os nossos mundos interiores e exteriores têm de ser integrados de uma forma harmoniosa.» (Bettelheim,1987)
 «Uma criança que não brinca, que não pode experimentar-se... que não jogou esses jogos de identificação, que não encontrou ecos de apoio nos que a rodeavam, tem mais dificuldades em viver coerentemente consigo e em dar espaço aos outros.» (Santos,1983)
O jardim-de-infância é também um espaço privilegiado para crescer com o jogo simbólico, com o desenho, a expressão corporal como actividade de transição entre dois mundos. Sendo o jogar e o brincar o meio natural de expressão da criança, ao educador cabe não só proporcionar-lhe essa oportunidade, como saber aproveitar toda a comunicação da criança para melhor a entender e com ela partilhar as suas descobertas, funcionando como o elo de ligação entre as suas duas realidades, devolvendo-lhe um sentimento de auto-estima, de que é aceite e de que o que investe tem valor.
O jardim em que se estabelecem boas relações afectivas, em que a criança deseja brincar e ser feliz, é um verdadeiro espaço de crescimento e de enquadramento evolutivo de uma aprendizagem que se faz lenta mas pensada e permite à criança que se estruture, crescendo mais um pouco.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A Expressão e Intervenção Artística na Educação e Formação da Criança(II)

O primeiro objectivo da área das expressões é o de desenvolver as capacidades de expressão, comunicação e intervenção criadoras da criança. Esta área no seu conjunto promove as actividades, plástica, musical e dramática, as quais se encontram, no programa do 1º Ciclo do Ensino Básico, organizadas numa perspectiva evolutiva ou seja, do simples para o complexo e mesmo assim de acordo com o ritmo e escalão etário de cada criança.
         É sabido que a criança ao chegar à escola é portadora de potencialidades criadoras, que são reveladas através do prazer de se movimentar, de brincar, jogar, construir, desenhar, pintar, modelar, cantar e dançar. No entanto também é um facto que muitas vezes a escola em vez de estimular e potencializar aquelas apetências, as condiciona e submete a criança a modelos e regras rígidas coarctando-lhe a espontaneidade, o que a leva a sair da escola com dificuldades de expressão a diversos níveis.
         A criança projecta-se no que faz com sinceridade sendo portanto necessário saber respeitar essa sua autenticidade. Contrariá-la, negá-la, é dificultar a relação que deve existir correctamente, entre o adulto e a criança. É, igualmente, levá-la ao sentimento de incapacidade e não atender à sua real necessidade de comunicar com os outros e com o mundo que a rodeia.
         A criança manifesta-se através do movimento corporal, da voz, do som, da palavra, da imagem, pelo que há que criar condições na escola e na sociedade para que ela se exprima espontaneamente e se desenvolva naturalmente de acordo com as suas capacidades emotivas, físicas e intelectuais, exprimindo as suas naturais sensações corporais, sentimentos, desejos, curiosidades, ideias, experiências e todo um conjunto de factos emotivos que transporta consigo.
         Por outro lado é através do estudo e compreensão dessas actividades que se poderá cada melhor, conhecer o mundo da criança.
         Infelizmente, durante largos anos a educação esteve mais preocupada com a adaptação do indivíduo ao meio social do que à sua capacidade de intervenção ou de iniciativa nesse mesmo meio, e, assim, aquela educação foi sendo concebida como um processo destinado a formar e a fortalecer a capacidade de raciocínio em claro detrimento de formas de expressão mais espontâneas. A lógica deste procedimento tinha por base de que era através do chamado pensamento racional que o humano podia dominar não só o meio em que vivia como igualmente a si próprio.
         Claro que hoje se pensa um pouco diferente. Hoje admite-se que não é possível caminhar correctamente sem que ambos os membros estejam de perfeita saúde. Hoje o subconsciente é admitido com sendo de extrema importância para ficar recalcado. Sabe-se, igualmente, que existem energias latentes que têm necessidade de ser expandidas e que tal só é possível em condições aceitáveis tendo por base as expressões.
         Contribuir para o "crescimento" do indivíduo tornando-o simultaneamente criativo e atento à criatividade dos que o rodeiam, é uma das principais metas da Expressão e Intervenção Artística. E isto porque ao tornar-se criativo, o indivíduo desenvolve qualidades essenciais e indispensáveis ao diálogo com a sensibilidade, a receptividade, a inteligência, a transparência lúcida, a fluidez e mobilidade de pensamento, a par do poder de análise, de síntese, de reflexão crítica, imaginação e, como não podia deixar de ser, prazer na descoberta.
         Podemos ainda acrescentar que a expressão criadora é a forma pessoal de cada um devolver ao exterior as impressões que capta do meio. Assim sendo é de extrema pertinência estimular as crianças para a utilização plena dos seus sentidos, proporcionando-lhe a utilização dos mais diversos meios de expressão.
         Todos nós precisamos de sentir e pensar com o corpo todo, e tanto no que diz respeito à utilização das palavras como igualmente em temos de imagens e acções.
         As Expressões, tal como as concebemos, são uma componente essencial da educação e visam o desenvolvimento global e harmonioso do ser humano.
         Já Platão recomendou que se fizesse, das diversas formas de arte, o fundamento do método educacional.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A Expressão e Intervenção Artística na Educação e Formação da Criança (I)

"A arte é dom de quem cria,
portanto não é artista,
aquele que copia,
as coisas que tem à vista."

                             António Aleixo

E era analfabeto o poeta Aleixo...
         Ainda hoje muitos “letrados” obrigam a criança a aprender (?) copiando, resumindo a sua expressão artística a simples ilustrações, joguinhos, corridinhas e pouco mais...
         No entanto é hoje reconhecida a importância das chamadas actividades expressivo/artístico no desenvolvimento harmonioso da pessoa humana.
A expressão na criança é antes de mais um processo altamente globalizante de toda a sua vida, contribui para a sua educação activa e renovadora e, mais de que qualquer outra actividade, faz intervir a totalidade da pessoa ou seja, a inteligência, a sensibilidade, a afectividade, a autonomia...
Estudos feitos provaram que as crianças, beneficiando de actividades de expressão artística, obtêm melhor rendimento nas outras disciplinas. É conhecida a facilidade da aprendizagem das línguas, das literaturas, da história, pelas dramatizações e que estas ajudam ainda a criança no seu processo de desenvolvimento pondo em jogo a sua expressividade, a sua criatividade e a sua consciência de valores, ao mesmo tempo que a ajudam na sua relacionação social, facilitando ao educador o conhecimento das diferentes manifestações da personalidade e adaptação ao meio.
 Por outro lado também se reconhece a importância da expressão plástica na aprendizagem da leitura e da escrita, bem como a do jogo como sendo o melhor meio de formação e o melhor veículo para favorecer a maturação de capacidades fisiológicas e sensoriais, possibilitando o desenvolvimento da observação, da atenção, da memória, do vocabulário, da imaginação... A expressão musical leva a criança a adquirir as aptidões necessárias para uma boa aprendizagem e ajuda-a a vencer a inércia bem como lhe desenvolve a capacidade de observação e o espírito crítico para além de outros aspectos igualmente importantes.      
         Assim sendo, há que promover a expressão livre e criativa da criança, potenciando as expressões, para tornar mais fáceis e agradáveis as aprendizagens, e dando lugar a que a acção educativa se processe tendo por base factores emotivos e afectivos altamente promotores do desenvolvimento.
         A criança precisa de sentir e pensar com o corpo todo. As expressões artísticas são fundamentais para o desenvolvimento das suas capacidades expressivas. Por outro lado, o contacto com a arte facilita o acesso à aprendizagem de outras áreas do conhecimento humano como vimos, sendo necessário que a criança, através delas, exprima as sensações corporais, sentimentos, desejos, ideias, curiosidades, experiências e todo um conjunto de factores emotivos que transporta em si.
Contribuir para o desabrochar do indivíduo, tornando-o criativo e atento à criatividade dos outros é um dos objectivos das expressões artísticas.
         Na arte não há nada definitivo, nada acabado. A arte está sempre a actualizar-se, a evoluir, a renovar-se como a vida e o próprio homem.
Assim sendo, a criança precisa dela para crescer em criatividade.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Brincar e Jogar: contributos para o desenvolvimento

          Já lá vão uns anitos é certo, mas ainda me lembro daquelas brincadeiras que fazia quando tinha tempos livres. Ele era o jogo do pião, ele era a apanhada, o berlinde, a cabra cega, aos reis e às rainhas, à corrente eléctrica, ao lenço, à rolha, às touradas, ao Zé da Mitra e claro, ao futebol e ao hóquei (sem patins), tendo como bolas os pobres marmelos em crescimento que, coitados, não tinham culpa  do dinheiro não chegar para comprar as ditas.

         Brincava muito jogando a tudo um pouco. Claro que de vez em quando ouvia um "ralhete" quando a brincadeira era em demasia. Claro que que também tinha as minhas obrigações, também ajudáva os meus pais, também fazia os meus deveres escolares(?). Mas bincava  e  jogava.(E ainda  brinco e jogo).

         Hoje a criança brinca e joga menos, ou melhor, o jogo está a ser considerado, erradamente, por muitos adultos, como perda de tempo no caminho que há-de levar a criança a engenheiro, a doutor, a arquitecto...

         A utilização do jogo é um valor directo no desenvolvimento físico, intelectual e social das crianças. O jogo é para a criança algo de bastante profundo. Estudos realizados em diversas escolas e levados a efeito por psicólogos especializados, têm mostrado que o jogo além de ser um exercício intelectual, é uma linguagem da vida emocional, e um dos principais meios para a criança pôr as suas fantasias em relações cada vez mais ligadas com a realidade causal e o mundo objectivo. E basta observarmos as crianças quando brincam para verificarmos, através da linguagem falada, que o jogo é para elas um meio de análise e de controle do sentimento e do pensamento.

         A criança fica facilmente ansiosa; os seus medos de perda de amor, perda de segurança e as suas ansiedades sobre os sentimentos fortes e ambivalentes, tornam-se rapidamente visíveis e aparecem sob a forma de hostilidade, recusa ou ambas. Os seus desejos entram em conflito com as exigências do ambiente; a sua vida imaginativa contém receios, ameaças secretas e não expressas.

         É nestas alturas que o jogo é para a criança um meio de expremir, concretamente, as fantasias do seu espírito, levando-a a exteriorizar emoções através do único meio de que dispõe para pensar, sendo um elemento fundamental na capacidade de, mais tarde, se aceitar a si mesma e, consequentemente, aos outros.

         É preciso que os pais e os educadores em geral, tenham consciência de que o jogo não é apenas para ser tolerado mas sim encorajado e visto com agrado. A família e a escola devem servisse do jogo da criança igualmente para a perceberem e para a ajudarem.

         Infelizmente muitos são ainda os pais e educadores que têm dificuldade em deixar as crianças brincar livremente, talvez porque no fundo de si mesmos não aceitaram a criança e temem    as suas fantasias;  talvez porque têm aversão à desarrumação e aos "estragos",  preferindo os brinquedos muito arrumadinhos, muito estimados, tão estimados que a criança não pode brincar com eles; talvez porque consideram o jogo e a brincadeira uma perda de tempo e estão ansiosos por a criança trabalhar bem e muito, de forma a  progredir rapidamente.

         Brincarem com ela nem pensar. "-Pai, brinca comigo ao macaquinho chinês!" ; "-Näo tenho tempo."; "- Estou cansado, brinco outro dia."; "- Só pensas na brincadeira. Vai mas é fazer os trabalhos da escola e deixa-me em paz".

         Claro que para estes pais, o jogo é algo desnecessário como desnecessário é o amor. Para eles o único objectivo da vida é o trabalho, vivendo toda uma vida de cabeça virada para baixo como a pobre da formiga.

         É pois necessário insistir em que as crianças precisam e muito, de tempo e espaço para os seus jogos, para as suas brincadeiras. Mesmo que o espaço seja uma raridade em muitas casas e em não poucas escolas, pelo menos um canto e muito tempo, têm de lhes ser concedidos.

         Atenção pois: quando uma criança não joga e não brinca é todo o seu desenvolvimento desde o afectivo, ao físico, ao intelectual, que está a ser atrofiado.Mas mais: o jogo é condição fundamental para o desenvolvimento infantil, mas  também o é para uma vida em busca da felicidade.

         Jogar é viver, mas viver - é preciso dizê-lo - também é jogar.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O Lúdico e a Criatividade

Brincar é o mundo da criança! Mas, tanto quando possível, deve brincar de uma forma livre e natural.
Ao permitir que tudo aconteça naturalmente como quem respira, a criatividade fomenta-se na criança. Não devemos esquecer que quanto mais discreta é a presença do educador, mais desinibida será a actividade da criança.
É a própria criança que descobre o seu modo de agir e de se exprimir, bem como o material e técnica que melhor se adaptam à sua própria expressão. Deve-se também dar uma série de materiais e de espaços, para que a criança desenvolva a sua criatividade. A criatividade desperta-se através do fazer, da experimentação constante.
O adulto, na sua acção de educador terá de ser autêntico perante a criança, tendo esta mais facilidade em aceitá-lo e em compreendê-lo, podendo estabelecer-se uma boa relação afectiva entre os dois. O importante é toda esta relação bilateral, decorrer num clima não directivo, liberto e libertador, que permita que a criança actue, se exprima espontaneamente e criativamente em contacto com os outros. A criatividade apela para uma pedagogia não directiva ou pelo menos flexível e aberta, que permita que seja a criança a descobrir o seu modo de agir e de se exprimir.
A capacidade criadora significa flexibilidade de pensamento e fluidez de ideias, podendo ser também a amplitude de conceber ideias novas.
A arte pode-se considerar um processo contínuo de desenvolvimento da capacidade criadora. Dando várias oportunidades às crianças estas têm a possibilidade de desenvolver o pensamento criador, na experiência artística.
Para que a criatividade se desenvolva é necessário que a criança explore, investigue e descubra. Através da experimentação, a criança exercita as suas faculdades sensoriais através dos diversos materiais, trazendo-lhe não só a alegria da actividade, mas proporcionando-lhe uma visão mais clara do mundo que a rodeia.
Não nos devemos preocupar em motivar as crianças para se comportarem de forma criativa, mas sim proporcionar-lhes caminhos onde a sua curiosidade os levem à exploração.
É sabido que a expressões permitem à criança exteriorizar os seus sentimentos, exprimindo os seus problemas afectivos, que na maioria das vezes não consegue exprimir oralmente, vai assim conhecer e explorar as coisas, descobrindo-as, fazendo com que esta crie e acrescente ao real, coisas da sua imaginação.
A criança é por natureza criadora. Está repleta de impulsos, tensões, de sensações, de sentimentos, desejos, necessitando de se expandir livremente. Ao observarmos uma criança em actividades livres, constatamos que esta é essencialmente expressiva e criadora. Ao possibilitar-se meios para que a criança actue livremente e a motivação remova a situação inibitória inicial, é como se se abrisse a porta para a saída da tudo aquilo que estava acumulado no íntimo do seu ser.
"A expressão criadora é o acto que vem de dentro, desenvolve a personalidade, forma o seu carácter e faz dela um ser sociável.” (STERN 1976)
É o ambiente que proporcionamos à criança que vai favorecer ou desfavorecer a capacidade criadora.
"Sem liberdade não há expressão!"( GONÇALVES 1976) Quantas vezes foi dita esta frase? Muitas! No entanto poucas vezes foi compreendido o seu verdadeiro significado. Quanto mais liberdade, mais responsabilidade e sendo assim aparece-nos a disciplina. Ao falar em disciplina, outras palavras vão surgir: segurança, tranquilidade, liberdade e responsabilidade.
A escola, as AECs, os ATLs sem dar conta, impõem modelos pré-concebidos que acabam por sufocar a potencialidade criadora que cada criança em si contém  e não há nada que substitua o que foi destruído pela pressão do adulto.
O Educador tem um papel fundamental. Se o adulto intervém na criação da criança não há dúvida que a altera, quer ele actue sobre a intenção ou sobre a maneira de executar o seu desenho. Na realidade, há duas atitudes; uma é actividade espontânea da criança, outra a actividade orientada. Na primeira pode o adulto aprender com a criança, a criança com o adulto ou um aprendizagem recíproca, na segunda é essencialmente a criança a aprender com o adulto. Estas duas atitudes, ao serem bem compreendidas e desenvolvidas, possibilitam a liberdade criadora, proporcionando o equilíbrio que nos fala Stern: equilíbrio entre acção livre e acção educativa. Para as crianças a arte, pode constituir o equilíbrio necessário entre o intelecto e as emoções, sendo esta um apoio que procuram naturalmente ainda que de modo inconsciente.
A exteriorização de toda a vida interior é a expressão que, será tanto mais rica, quanto maior as possibilidades de encontrar um meio favorável. Seja qual for a estratégia utilizada: movimento, canções, jogos, pintura ou outras actividades, a expressão "não é um espectáculo para os ouvidos, mas sim uma expressão de sentimentos".( STERN 1976)